gil fronsdalQue todos os seres sejam felizes.
Que todos vivam seguros e felizes.
Todos os seres vivos,
Sejam fracos ou fortes,
Altos, largos, medianos ou baixos,
Visíveis ou invisíveis, próximos ou distantes,
Nascidos ou por nascer,
Que todos sejam felizes.
– do Mettā Sutta, Sutta Nipāta I.8

Mettā ou amorosidade é uma das práticas buddhistas mais importantes. De forma mais simples, mettā é o desejo sincero pelo bem-estar de si mesmo e dos outros. Quando descrevia mettā, Buddha usava a analogia do cuidado que uma mãe tem por seu filho único. A amorosidade está intimamente relacionada à suavização do coração que faz com que tenhamos empatia com a felicidade e o sofrimento do mundo.

Amorosidade é também entendida como a inata afabilidade de um coração aberto. Sua conexão muito próxima com a amizade se reflete em sua similaridade com a palavra pāli para amigo: mitta. Entretanto, mettā é mais do que uma amizade convencional, porque inclui estar de coração aberto mesmo em relação aos inimigos, cultivada talvez pela empatia ou pelo insight de nossa humanidade compartilhada.

A prática de mettā é o cultivo de nossa capacidade para a amorosidade. Isso não envolve o pensamento positivo ou a imposição de uma atitude positiva artificial. Não há necessidade de sentir amor durante a prática mettā. Em vez disso, nós meditamos sobre nossas intenções, não importa quão fracas ou fortes elas sejam. Na sua essência, a prática da amorosidade envolve dar expressão aos nossos desejos de bem-estar e felicidade para nós mesmos ou para os outros.

Na prática de mettā regamos as sementes das nossas boas intenções. Quando regamos intenções saudáveis, em vez de expressar as insalubres, desenvolvemos essas tendências saudáveis dentro de nós. Se essas sementes nunca forem regadas, não crescerão. Quando regadas pela prática regular elas crescem, por vezes em formas inesperadas. Podemos descobrir que a amorosidade se torna a motivação operacional numa situação que anteriormente desencadeava raiva ou medo.

Reconhecer e expressar a boa vontade tem um efeito abrandador em nossos corações. Por vezes, isso evoca sentimentos de amor, ternura e afeição. Outras vezes, esse abrandamento do coração pode expor emoções enterradas difíceis ou dolorosas. Permitir que todas essas emoções venham à tona a seu próprio tempo é uma função da prática da amorosidade.

Quando encontramos dificuldade em nos relacionar com os outros e com nós mesmos com as intenções de bondade, a prática de mettā pode dar um ponto de referência útil para nos ajudar a ver o que estamos de fato sentindo. A ausência de amorosidade pode ser uma dica importante, não para provocar a auto-crítica, mas para nos lembrar de desacelerar e prestar uma atenção mais cuidadosa para o que está realmente acontecendo.

As práticas de vigilância e amorosidade se apoiam uma na outra. A prática de mettā complementa a vigilância ao encorajar uma atitude de amizade para com as nossas experiências independente de quão difíceis elas possam ser. A vigilância complementa a amorosidade protegendo-a de se tornar parcial ou sentimental. Mettā pode nutrir uma proximidade nos nossos relacionamentos com os outros; vigilância pode ajudar a manter nosso equilíbrio nessas relações. Vigilância pode trazer liberdade; amorosidade assegura que o nosso caminho para a liberdade não esteja indiferente a outras pessoas.

 


Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda
revisão: Ricardo Sasaki
em acordo com o Autor

© 2015 Gil Fronsdal

Nota: “Tocar o Coração do Assunto” é uma compilação de ensaios editados sobre a prática buddhista da observação vigilante. Muitos destes capítulos começaram como palestras dadas aos grupos de meditação da noite de segunda-feira ou da manhã de domingo do Insight Meditation Center em Redwood City, Califórnia. Alguns dos capítulos foram escritos especificamente para a publicação em jornais, em revistas ou em boletins de notícias buddhistas. Este livro é uma oferenda do Dhamma.


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