~ Ajahn Chah ~
[1] Hoje é o dia em que nós, buddhistas, nos reunimos para observar os preceitos do uposatha [2] e ouvir o Dhamma, como é nosso costume. A razão de ouvir o Dhamma é, em primeiro lugar, criar alguma compreensão das coisas que ainda não entendemos, esclarecê-las e, ainda, melhorar nossa compreensão das coisas que já entendemos. Devemos contar com as palestras do Dhamma para melhorar a nossa compreensão, e ouvir é o fator crucial.
Para a conversa de hoje, por favor, prestem atenção especial, antes de tudo, endireitando sua postura a fim de ser adequada a ouvir. Não fiquem muito tensos. Agora, tudo que resta é focar suas mentes, firmes em samādhi. A mente é o ingrediente principal. A mente é aquela que percebe o bem e o mal, o certo e o errado. Se nos falta sati (a vigilância) que seja por um minuto, estaremos loucos por este minuto; se nos falta sati por meia hora, estaremos loucos por esta meia hora. Pelo tempo que for que nossa mente estiver carente de sati, é este o tempo em que estaremos loucos. É por isso que é especialmente importante prestar atenção ao ouvir o Dhamma.
Todas as criaturas deste mundo estão atormentadas apenas pelo sofrimento. Há apenas o sofrimento a perturbar a mente. O estudo do Dhamma tem como propósito destruir totalmente esse sofrimento. Se o sofrimento surge é porque realmente não o conhecemos. Não importa o quanto tentemos controlá-lo por meio de força de vontade ou por meio de riquezas e bens; é impossível. Se não entendemos completamente o sofrimento e a sua causa, não importa o quanto tentemos “barganhar” com os nossos atos, pensamentos ou com as riquezas do mundo, não há nenhuma maneira de fazê-lo. Só por meio do conhecimento e da consciência clara, por meio de conhecer a verdade, é que o sofrimento pode desaparecer. E isso se aplica não só para os sem-lar, os monges e noviços, mas também aos que estão em casa: para quem conhece a verdade das coisas, o sofrimento cessa automaticamente.
Agora, os estados de bem e mal são verdades constantes. Dhamma significa aquilo que é constante, o que se mantém. Tumulto mantém seu tumulto, serenidade mantém sua serenidade. Bem e mal mantêm suas respectivas condições – como a água quente: ela mantém a sua quentura, isso não muda para ninguém. Quer uma pessoa seja jovem ou idosa, quando ela bebe dessa água, ela sente o quente. Está quente para todas as nacionalidades de pessoas. Assim, Dhamma é definido como aquilo que mantém sua condição. Em nossa prática devemos conhecer calor e frio, certo e errado, bem e mal. Conhecendo o mal, por exemplo, não vamos criar as causas para o mal, e o mal não irá surgir.
Os praticantes do Dhamma deveriam conhecer a origem dos vários dhammas. Ao eliminar a causa do calor, o calor não pode mais surgir. É o mesmo com o mal: ele surge a partir de uma causa. Se praticarmos o Dhamma até conhecermos o Dhamma, vamos conhecer a origem das coisas, suas causas. Se extinguirmos a causa do mal, o mal também se extingue, não temos que sair correndo atrás do mal para acabar com ele.
Essa é a prática do Dhamma. Porém são muitos os que estudam o Dhamma, aprendem-no, chegam a praticá-lo, mas não estão ainda com o Dhamma e não eliminaram ainda a causa do mal e da agitação dentro de seus próprios corações. Enquanto a causa do calor ainda estiver presente, não temos como impedir o surgimento do calor. Do mesmo modo, enquanto a causa da confusão estiver em nossas mentes, não temos como impedir o surgimento da confusão, porque essas coisas surgem de suas causas. Enquanto a causa não for eliminada, a confusão vai aparecer de novo.
A qualquer momento que criemos boas ações a bondade vai surgir na mente. Ela surge de suas causas. Isso é chamado kusala [3]. Se entendermos as causas desse modo, poderemos criar tais causas e seus resultados naturalmente se seguirão.
Mas as pessoas não costumam criar as causas certas. Elas querem muito a bondade, mas ainda assim não trabalham para realizá-la. Tudo o que recebem são maus resultados, enredando a mente em sofrimento. Tudo o que as pessoas querem hoje em dia é o dinheiro. Elas pensam que se apenas conseguirem dinheiro suficiente tudo ficará bem; então, elas gastam todo o seu tempo à procura de dinheiro, elas não olham para a bondade. Isso é como querer carne, mas não querer sal para conservá-la: basta deixar a carne jogada pela casa para que ela apodreça. Aqueles que querem dinheiro devem saber não só como encontrá-lo, mas também como cuidar dele. Se você quer carne, você não pode querer comprá-la e, em seguida, deixá-la espalhada pela casa. Ela irá apodrecer. Esse tipo de pensamento está errado. O resultado do pensamento errado é o tumulto e a confusão. O Buddha ensinou o Dhamma para que as pessoas o colocassem em prática, a fim de conhecê-lo e vê-lo, e para ser um com ele, para tornar a mente em Dhamma. Quando a mente é Dhamma ela alcança a felicidade e o contentamento. A inquietude do samsāra está neste mundo, e a cessação do sofrimento também está neste mundo.
A prática do Dhamma é, assim, para conduzir a mente à transcendência do sofrimento. O corpo não pode transcender o sofrimento – tendo nascido, ele deve vivenciar dor e doença, envelhecimento e morte. Só a mente pode transcender o apego e o anseio. Todos os ensinamentos do Buddha, que chamamos pariyatti [4], são um meio hábil para esse fim. Por exemplo, o Buddha ensinou sobre upādinnaka-sankhārā e anupādinnaka-sankhārā – condições atendidas pela mente e condições não atendidas pela mente. Condições não atendidas pela mente são geralmente definidas como coisas tais como árvores, montanhas, rios e assim por diante – coisas inanimadas. Condições atendidas pela mente são definidas como coisas animadas – animais, seres humanos e assim por diante. A maioria dos estudantes de Dhamma toma essa definição como certa, mas se vocês considerarem o assunto profundamente, o modo como a mente humana fica tão obcecada por visões, sons, cheiros, gostos, sentimentos e estados mentais, vocês poderão ver que realmente não há qualquer coisa que não seja atendida pela mente. Enquanto houver desejo na mente, tudo se torna atendido pela mente.
Estudar o Dhamma sem praticá-lo faz com que não entendamos os significados mais profundos. Por exemplo, poderíamos pensar que os pilares desta sala de reunião, as mesas, bancos, e todas as coisas inanimadas, são “não-atendidas”. Olhamos apenas para um lado das coisas. Mas tente pegar um martelo e destruir algumas destas coisas e você verá se são influenciadas ou não pela mente!
É a nossa própria mente, agarrando-se às mesas, cadeiras e todas as nossas posses, que torna essas coisas presentes. Mesmo quando um copinho quebra isso dói, porque nossa mente se “envolve” com aquele copo. Sejam elas árvores, montanhas ou qualquer coisa, o que quer que sentimos ser nosso, elas têm uma mente se preocupando com elas – se não a sua própria, então a de outra pessoa. Essas são todas “condições em que a mente participa”, e não “não-participadas pela mente”.
É a mesma coisa com o nosso corpo. Normalmente diríamos que o corpo é participado pela mente. A “mente” que atenta para o corpo não é outra que upādāna, aderindo-se, agarrando o corpo e apegando-se a ele como sendo “mim” e “meu”.
Assim como um cego não pode conceber cores – não importa onde ele olhe, cor alguma pode ser vista -, da mesma forma para a mente bloqueada por desejo sedento e ilusão, todos os objetos da consciência tornam-se atendidos pela mente. Para a mente contaminada com desejo sedento e obstruída pela ilusão, tudo se torna atendido pela mente… mesas, cadeiras, animais e tudo o mais. Se achamos que há um ego intrínseco, a mente se adere a tudo. Toda a natureza torna-se envolvida pela mente, há sempre adesão e apego.
O Buddha falou sobre sankhata dhammas e asankhata dhammas – coisas condicionadas e incondicionadas. As coisas condicionadas são inumeráveis – materiais ou imateriais, grandes ou pequenas – se nossa mente está sob a influência da ilusão, ela vai proliferar com base nessas coisas, dividindo-as em boas e más, curtas e longas, grosseiras e refinadas. Por que a mente prolifera assim? Porque ela não sabe da realidade condicionada [5], ela não vê o Dhamma. Não vendo o Dhamma, a mente está cheia de apego. Enquanto a mente for controlada pelo apego, não pode haver escape; há confusão, nascimento, envelhecimento, doença e morte, mesmo nos processos de pensamento. Esse tipo de mente é chamada de sankhata dhamma (mente condicionada).
Asankhata dhamma, o incondicionado, refere-se à mente que viu o Dhamma, a verdade, dos cinco khandhas como eles são – como transitórios, imperfeitos e sem-dono. Todas as ideias de “eu” e “eles”, “meu” e “deles”, pertencem à realidade determinada. Realmente eles são todos condições. Quando conhecemos a verdade das condições, não como nós mesmos nem como pertencentes a nós, ficarmos livres das condições e do determinado. Quando ficarmos livres das condições atingiremos o Dhamma, entraremos e realizaremos o Dhamma. Quando atingirmos o Dhamma saberemos claramente. O que saberemos? Saberemos que há apenas condições e determinações, não ser, não ego, não “nós” nem “eles”. Esse é o conhecimento de como são as coisas.
Vendo dessa maneira, a mente transcende as coisas. O corpo pode envelhecer, adoecer e morrer, mas a mente transcende esse estado. Quando a mente transcende essas condições, ela conhece o incondicionado. A mente torna-se o incondicionado, o estado que deixa de possuir fatores condicionantes. A mente não é mais condicionada pelas preocupações mundanas; as condições não contaminam mais a mente. Prazer e dor não a afetam mais. Nada pode afetá-la ou mudá-la, a mente é segura; ela escapou de todas as construções. Ao ver a verdadeira natureza das condições e do determinado, a mente torna-se livre.
Esta mente livre é chamada de Incondicionada, e é tal que está para além do poder das influências construtivas. Se a mente não conhece realmente condições e determinações, então ela é movida por elas. Ao encontrar o bom, o mau, o prazer ou a dor, ela prolifera em torno deles. Porque é que prolifera? Qual a causa? A causa é o entendimento de que o corpo é ‘eu próprio’ ou ‘pertence ao eu’; de que sensações são ‘eu próprio’ ou pertencentes ao eu; de que percepção é ‘eu próprio’ ou pertencente ao eu; de que a consciência é ‘eu próprio’ ou ‘pertence ao eu’. A tendência de conceber as coisas em termos de ‘si mesmo’ é a fonte de felicidade, sofrimento, nascimento, velhice, doença e morte. Esta é a mente mundana, rodando e se transformando de acordo com as condições do mundo. Esta é a mente condicionada.
Se recebemos algo inesperado, nossa mente fica condicionada por isso. Esse objeto influencia nossa mente num sentimento de prazer, mas quando ele desaparece, nossa mente fica condicionada por ele e sofre. A mente torna-se escrava de condições, escrava do desejo. Não importa o que o mundo lhe apresente, a mente movimenta-se de acordo. Essa mente não tem refúgio, ainda não está segura de si mesma, ainda não é livre. Ela ainda precisa de uma base sólida. Essa mente ainda não sabe a verdade das condições. Assim é a mente condicionada.
Todos vocês que ouvem o Dhamma aqui, reflitam por um tempo… até mesmo uma criança pode fazê-lo ficar com raiva, não é mesmo? Até mesmo uma criança pode enganá-lo. Ela poderia induzi-lo a chorar, rir – ela poderia induzi-lo a todos os tipos de coisas. Mesmo as pessoas de idade são enganadas por essas coisas. Para uma pessoa iludida que não conhece a verdade das condições, elas estão sempre a moldar a mente por inúmeras reações, tais como amor, ódio, prazer e dor. Elas moldam nossas mentes dessa forma porque estamos escravizados por essas reações. Somos escravos de tanhā, do desejo sedento. O desejo dá todas as ordens, e nós simplesmente obedecemos.
Escuto as pessoas reclamando: “Ó, eu sou tão miserável. Noite e dia eu tenho que ir ao campo, não tenho tempo para ficar em casa. No meio do dia eu tenho que trabalhar no sol quente, sem sombra. Não importa quanto frio está, eu não posso ficar em casa, eu tenho que ir trabalhar. Eu sou tão oprimido”.
Se eu pergunto a elas: “Por que você não deixa sua casa e se torna um monge?” Elas dizem: “Eu não posso deixar, eu tenho responsabilidades”. Tanhā puxa-as de volta. Algumas vezes, quando você está arando você pode estar explodindo tanto para urinar que tem que fazê-lo enquanto está arando, como os búfalos! Isto é quanto o desejo as escraviza.
Quando eu pergunto: “Como você está? Não tem tempo para vir para o mosteiro?”. Elas dizem: “Ó, estou realmente atolado até o pescoço”. Eu não sei em que é que estão presos tão profundamente! Estas são apenas condições, concocções. O Buddha ensinou a ver as aparências como tais, a ver as condições como elas são. Isto é ver o Dhamma, ver as coisas como elas realmente são. Se você realmente perceber essas duas coisas, então, você deve jogá-las fora, deixá-las passar.
Não importa o que você possa receber, isso não tem substância real. A princípio pode parecer bom, mas eventualmente acabará por ser ruim. Isso fará com que você ame e odeie, fará você rir e chorar, fará você seguir para onde lhe puxarem. Por que é assim? Porque a mente não está desenvolvida. Condições tornam-se fatores condicionantes da mente, tornando-a grande e pequena, feliz e triste.
No tempo de nossos antepassados, quando uma pessoa morria, eles convidavam os monges para visitar e recitar recordações acerca da impermanência:
Aniccā vata sankhārā
Uppāda-vaya-dhammino
Uppajjitvā nirujjhanti
Tesam vūpasamo sukho
Impermanentes são todas as coisas condicionadas
Têm a natureza de surgir e passar
Tendo nascido, todas terão de perecer
A cessação das condições é a verdadeira felicidade.
Todas as condições são impermanentes. O corpo e a mente são ambos impermanentes. Eles são impermanentes porque não permanecem fixos e imutáveis. Todas as coisas que nascem devem necessariamente mudar, elas são transitórias – especialmente o nosso corpo. O que é que não muda dentro deste corpo? Cabelos, unhas, dentes, pele… eles ainda são os mesmos que eram? As condições do corpo estão em constante mudança, por isso ele é impermanente. O corpo é estável? A mente é estável? Pense nisso. Quantas vezes eles surgem e cessam até em um mesmo dia? O corpo e a mente estão constantemente surgindo e cessando, as condições estão em um estado de agitação constante.
A razão porque você não pode ver essas coisas alinhadas com a verdade é porque você continua acreditando naquilo que é falso. É como ser guiado por um homem cego. Como você pode fazer sua jornada em segurança? Um homem cego só o levará à floresta. Como ele poderia guiá-lo em segurança quando não pode ver? Da mesma maneira, nossa mente é iludida por condições, criando sofrimento na procura por felicidade, criando dificuldades na procura por alívio. Uma mente assim só cria mais dificuldades e sofrimento. Realmente desejamos nos livrar do sofrimento e da dificuldade, mas acabamos por criar essas mesmas coisas. Tudo o que podemos fazer, então, é reclamar. Criamos condições ruins e a razão para isso é que não compreendemos a verdade das aparências e das condições.
As condições são impermanentes, ambas as atendidas pela mente e as não atendidas pela mente. Na prática, as condições não cuidadas pela mente são inexistentes. O que é que não é cuidado pela mente? Mesmo o seu próprio banheiro, que você pensaria não ser atendido pela mente… tente deixar alguém esmagá-lo com uma marreta! A pessoa provavelmente teria que lidar com as “autoridades”. A mente assiste a tudo, até mesmo as fezes e a urina. Exceto para a pessoa que vê claramente como as coisas são, não há tal coisa como condições não cuidadas pela mente.
Aparências são determinadas pela existência. Por que temos que determiná-las? Porque intrinsecamente elas não existem. Por exemplo, suponha que alguém queria fazer um marca. Ele iria pegar um pedaço de madeira ou uma pedra e colocá-lo no chão, em seguida, chamá-lo de uma marca. Não há qualquer marca, e é por isso que você deve determinar sua existência. Da mesma forma que “determinamos” cidades, pessoas, gado – tudo! Por que devemos determinar essas coisas? Porque originalmente elas não existem.
Conceitos como “monge” e “leigo” são também “determinações”. Determinamos essas coisas à existência, porque intrinsecamente elas não estão ali. É como ter um prato vazio – você pode colocar o que quiser nele porque está vazio. Essa é a natureza da realidade determinada. Homens e mulheres são simplesmente conceitos determinados, assim como todas as coisas que nos cercam.
Se conhecermos claramente a verdade das definições, saberemos que não existem seres, porque “seres” são coisas determinadas. Entendendo que essas coisas são simplesmente definições, você pode estar em paz. Mas se você acredita que a pessoa, ser, o “meu”, o “deles”, e assim por diante, são qualidades intrínsecas, então, você deve rir e chorar por elas. Essas são as proliferações dos fatores condicionantes. Se tomarmos essas coisas como nossas haverá sempre sofrimento. Isto é micchāditthi, ponto de vista incorreto. Os nomes não são realidades intrínsecas, são verdades provisórias. Só depois que nascemos é que vamos receber nomes, não é mesmo? Ou você tem o seu nome já quando você nasceu? O nome vem depois, certo? Por que temos de determinar esses nomes? Porque intrinsicamente eles não estão lá.
Deveríamos entender claramente essas determinações. Bom, mau, alto, baixo, preto e branco são todos determinações. Estamos todos perdidos em determinações. É por isso que em cerimônias fúnebres, os monges cantam: aniccā vata sankhārā… Condições são impermanentes, elas surgem e desaparecem. Essa é a verdade. O que existe que, tendo surgido, não termina? Bons humores surgem e, então, desaparecem. Você alguma vez viu alguém chorar por três ou quatro anos? No máximo, você pode ver pessoas chorando uma noite inteira e, então, as lágrimas secam. Tendo surgido, elas desaparecem…
Tesam vūpasamo sukho [6]…. Se entendermos sankhāras, as proliferações e, assim, as subjugarmos, essa será a maior das felicidades. Esse é o verdadeiro mérito, ter-se acalmado das proliferações, acalmado do “ser”, acalmado da individualidade, do fardo do si mesmo. Transcendendo essas coisas, vê-se o Incondicionado. Isso significa que não importa o que aconteça, a mente não vai proliferar ao redor disso. Não há nada que possa tirar a mente de seu equilíbrio natural. O que mais vocês podem querer? Isso é o fim, a conclusão.
O Buddha ensinou como as coisas são. O fazer oferendas, o ouvir palestras sobre o Dhamma, e assim por diante, têm por objetivo buscar e perceber isso. Se nos damos conta disso, não temos que estudar vipassanā (meditação do insight), ela vai acontecer por si só. Também samatha (calma) e vipassanā são determinados pelo existir, como as outras determinações. A mente que sabe, a qual está além dessas coisas, é o ponto culminante da prática.
Nossa prática e nossa investigação têm como objetivo transcender o sofrimento. Quando você liquida com o apego, estados de existência terminam. Quando estados de existência terminam, não há mais nascimento ou morte. Quando as coisas estão indo bem, a mente não se alegra, e quando as coisas vão mal, a mente não se aflige. A mente não é arrastada por todo o lugar pelas tribulações do mundo e, por isso, a prática está terminada. Este é o princípio básico do ensinamento dado pelo Buddha.
O Buddha ensinou o Dhamma para ser usado em nossas vidas. Mesmo quando morremos há o ensino Tesam vūpasamo sukho… mas não dominamos essas condições, nós somente as carregamos por aí, como se os monges estivessem nos dizendo para fazê-lo. Nós as carregamos e choramos por causa delas. Tudo isso se perde nas condições. Céu, inferno e Nibbāna estão todos revelados neste ponto.
Praticar o Dhamma é feito de modo a transcender o sofrimento na mente. Se soubermos a verdade das coisas, como eu já expliquei aqui, saberemos automaticamente as Quatro Nobres Verdades – o sofrimento, a causa do sofrimento, a cessação do sofrimento e o caminho que conduz à cessação do sofrimento.
As pessoas geralmente são ignorantes quando se trata de determinações, elas pensam que elas existem por si mesmas. Quando os livros nos dizem que as árvores, montanhas e rios são condições não atendidas pela mente, isso é simplificar as coisas. Isso é apenas ensino superficial, não há nenhuma referência ao sofrimento, como se não houvesse sofrimento no mundo. Isso é apenas a casca do Dhamma. Se tivéssemos que explicar as coisas em termos da verdade última, veríamos que são as pessoas que agem e prendem todas essas coisas com seus apegos. Como você pode dizer que as coisas não têm poder para moldar os eventos, que elas não são atendidas pela mente, quando as pessoas batem em seus filhos por pequenos motivos? Um simples prato ou copo, uma tábua… a mente capta todas essas coisas. Apenas olhe o que acontece se alguém esmaga um destes e você descobre. Tudo é capaz de nos influenciar nesse sentido. Compreender essas coisas inteiramente é nossa prática, examinar essas coisas que são condicionadas, incondicionadas, atendidas pela mente e não atendidas pela mente.
Isso faz parte do “ensinamento externo”, como o Buddha uma vez se referiu a ele. Uma vez, o Buddha estava morando na floresta. Com uma mão cheia de folhas, Ele perguntou aos bhikkhus: “Bhikkhus, o que há em maior número: as folhas que eu seguro na minha mão ou as folhas espalhadas pelo chão da floresta?” Os bhikkhus responderam: “As folhas na mão do Bem-Aventurado são poucas, as folhas espalhadas pelo chão da floresta estão em bem maior número”.
“Da mesma maneira, monges, a totalidade do ensinamento do Buddha é vasta, mas o conhecimento dessa totalidade não é a essência e não está diretamente relacionado ao fim do sofrimento. Há muitos aspectos nos ensinamentos, mas aquilo que o Tathāgata realmente quer que façamos é transcender o sofrimento, que averiguemos as coisas e abandonemos o apego à forma, sensação, percepção, volição e consciência [7]”. Parem de se apegar a essas coisas e vocês transcenderão o sofrimento. Esses ensinamentos são como as folhas na mão do Buddha. Vocês não precisam de tanto, apenas um pouco é o suficiente. Quanto ao restante do ensinamento, vocês não precisam se preocupar com ele. É exatamente como a grande terra: abundante, com gramíneas, solo, montanhas, florestas. Não há escassez de pedras e seixos, mas todas essas rochas não são tão valiosas como uma única joia. O Dhamma do Buddha é assim, vocês não precisam de muito.
Assim, estejam falando sobre o Dhamma ou ouvindo-o, vocês deveriam conhecer o Dhamma. Vocês não precisam se perguntar onde está o Dhamma, ele está aqui mesmo. Não importa onde irão para estudar o Dhamma, ele está, na verdade, nas suas mentes. A mente é o que se apega, é o que especula, a mente é o que transcende, o que larga. Todos esses estudos externos são, de fato, sobre a mente. Não importa se você estuda o tipitaka [8], o abhidhamma [9] ou o que seja, não se esqueçam de onde isso veio.
No que toca à prática, as únicas coisas que precisam para começar é honestidade e integridade. Não precisam criar muitos problemas para vocês mesmos. Nenhum de vocês, laicos, estudou o Tipitaka, mas são capazes de sentir a ganância, o ódio e a ilusão, não é? De onde ouviram essas coisas? Tiveram que ler o Tipitaka ou o Abhidhamma para terem ganância, ódio e ilusão? Essas coisas estão nas suas mentes, não é preciso estudá-las para as terem. Mas os ensinamentos são para inquirirmos e abandonarmos essas coisas.
Deixe o conhecimento espalhar de dentro de você e você estará praticando de forma correta. Se quiser ver um trem, vá a uma ferroviária. Você não precisa viajar todas as rotas das linhas para o norte, para o sul, para o leste e para o oeste para ver todos os trens. Se quiser ver trens, cada um deles, é melhor você esperar na Estação Central, onde todos eles chegam.
Algumas pessoas me dizem: “Quero praticar, mas eu não sei como. Não consigo estudar as escrituras, estou ficando velho, minha memória não é tão boa…” Apenas observe o aqui e agora, na “Estação Central”. Ganância cresce aqui e agora, raiva cresce aqui e agora, ilusão cresce aqui e agora. Apenas se sente e poderá ver todas essas coisas surgindo. Pratique aqui e agora, porque é onde você está preso. O aqui e agora é onde a determinação surge, onde as convenções surgem, e no aqui e agora é onde o Dhamma surgirá.
Dessa maneira, a prática do Dhamma não distingue entre classes ou raças, tudo o que exige é olhar para dentro, ver e entender. Inicialmente, treinamos o corpo e a fala a fim de sermos livres das contaminações, e isso é sīla. Algumas pessoas pensam que para ter sīla é preciso memorizar frases em pāli e recitá-las dia e noite, mas realmente tudo o que precisam fazer é tornar seu corpo e fala sem manchas; isso é sīla. Não é difícil entender, é como cozinhar… coloque um pouco disto e um pouco daquilo, até estar certo… e fica delicioso! Você não precisa acrescentar nada mais para torná-lo delicioso, isso já está delicioso, apenas precisa colocar os ingredientes corretos. Do mesmo modo, cuidar de maneira que nossas ações e linguagem sejam apropriadas, isso nos dará sīla.
A prática do Dhamma pode ser feita em qualquer lugar. No passado, eu viajei por todos os lados à procura de um professor porque eu não sabia como praticar. Estava sempre com medo de estar praticando errado. Eu viajava constantemente de uma montanha para outra, de um lugar para outro, até que parei e refleti sobre isso. Agora eu entendo. No passado, eu devo ter sido muito estúpido, eu fui a todo lugar em busca de locais para praticar a meditação – eu não sabia que ela já estava lá, no meu coração. Toda a meditação que quiserem está dentro de vocês. Há nascimento, velhice, doença, morte aqui mesmo dentro de vocês. Por isso, o Buddha disse Paccattam veditabbo viññūhi – o sábio deve saber por si mesmo. Eu tinha dito as palavras antes, mas ainda não sabia o seu significado. Viajei por todo o lado procurando por ele até estar pronto a cair morto de exaustão – só então, quando parei, eu encontrei o que procurava, dentro de mim. Agora eu posso lhes falar sobre isso.
Assim, em sua prática de sīla, apenas pratiquem tal como expliquei aqui. Não duvidem da prática. Mesmo que algumas pessoas possam dizer que vocês não podem praticar em casa, que há muitos obstáculos… se esse é o caso, então, mesmo comer e beber serão obstáculos. Se essas coisas são obstáculos para praticar, então não coma. Se você está em pé sobre um espinho, isso é bom? Não é melhor não estar sobre um espinho? A prática do Dhamma traz benefícios para todas as pessoas, independentemente da classe. O quanto vocês praticarem será o quanto conhecerão a verdade.
Algumas pessoas dizem que não podem praticar como laico, que o seu ambiente é muito cheio de gente. Se você mora em um lugar apertado, então analise o apertado, torne-o aberto e amplo. Sua mente tem sido iludida pelo cheio, treine-a para saber a verdade sobre o cheio. Quanto mais você negligenciar a prática, quanto mais você negligenciar a ida para o mosteiro e o ouvir dos ensinamentos, mais a sua mente vai se afundar no pântano, como um sapo que entra em um buraco. Alguém chega com uma armadilha para sapos, e ele não tem chance. Tudo que ele pode fazer é esticar o pescoço e se entregar. Então, cuidado para não se colocar em um beco sem saída, pois alguém pode vir e capturá-lo. Em casa, ao ser incomodado por seus filhos e netos você estará em uma situação ainda pior do que o sapo. Você não sabe como se distanciar dessas coisas. Quando idade, doença e velhice chegarem, o que você irá fazer? Essa é a armadilha que vai pegar você. Para onde você poderá se virar?
Esta é a situação em que nossas mentes se encontram. Envolvida com filhos, com parentes, com pertences… e você não sabe como soltá-los. Sem moralidade ou compreensão de como se livrar das coisas, não há nenhuma maneira de você escapar. Quando sensação, percepção, volição e consciência produzem sofrimento, você sempre é pego por ele. Por que existe o sofrimento? Se você não investigar você não vai saber. Se a felicidade surge você simplesmente é pego pela felicidade, deliciando-se com ela. Você não se pergunta: ‘De onde vem essa felicidade?’
Então, mude o seu entendimento. Você pode praticar em qualquer lugar, porque a mente está com você em todos os lugares. Se você pensar em coisas boas enquanto está sentado, você pode estar ciente delas; se você tiver maus pensamentos, você pode estar ciente deles também. Essas coisas estão com você. Enquanto deitado, se tiver pensamentos bons ou maus, você pode conhecê-los também, porque o lugar para a prática é a mente. Algumas pessoas pensam que você tem que ir para o mosteiro a cada dia. Isso não é necessário, basta olhar para sua própria mente. Se você sabe onde está a prática, então você estará assegurado.
Os ensinamentos do Buddha nos dizem para nos observarmos, para não correr atrás de modismos e superstições. É por isso que ele disse [10]:
Sīlena sugatim yanti: Retidão moral conduz ao bem-estar
Sīlena bhogasampadā: Retidão moral leva à riqueza
Sīlena nibbutim yanti: Retidão moral leva ao Nibbāna
Tasmā sīlam visodhaye: Portanto, mantenha os seus preceitos de modo puro.
Sīla refere-se às nossas ações. Boas ações trazem bons resultados, más ações trazem maus resultados. Não esperem que os deuses façam algo por vocês, que os anjos e as divindades guardiãs os protejam, ou que dias auspiciosos lhes ajudem. Essas coisas não são verdade, não acreditem nelas. Se acreditarem nelas sofrerão. Vocês estarão sempre aguardando pelo dia certo, pelo mês certo, pelo ano certo, pelos anjos e divindades guardiãs… sofrerão desse jeito. Olhem para suas próprias ações e discursos, para o seu próprio kamma. Fazendo o bem vocês herdam bondade, fazendo o mal vocês herdam maldade.
Se entenderem que bem e mal, certo e errado, tudo se encontra dentro de você, então não terão que sair procurando essas coisas em outro lugar. Basta procurar essas coisas onde elas surgem. Se perderem alguma coisa aqui, devem procurar por isso aqui. Mesmo se não encontrá-la primeiramente, continuem procurando onde a largaram. Mas, normalmente, nós a perdemos aqui, e vamos procurá-la lá. Quando você irá encontrá-la? Boas e más ações se encontram dentro de vocês. Um dia acabarão por vê-las, apenas continuem procurando exatamente ali.
Todos os seres seguem na vida de acordo com seu kamma. O que é kamma? As pessoas são muito fáceis de enganar. Se vocês cometem más ações, é dito que Yama, o rei do submundo, vai registrar tudo em um livro. Quando vocês chegam lá, ele faz as suas contas e olha para vocês de cima… Vocês todos têm medo do Yama no pós-vida, mas vocês não conhecem o Yama dentro de suas próprias mentes. Se cometem más ações, mesmo que passem desapercebidos e as façam sozinhos, este Yama vai registrar tudo. Entre vocês aqui sentados, provavelmente existem muitos que fizeram secretamente coisas ruins, não deixando ninguém mais ver. Mas vocês veem, não é? Este Yama vê tudo isso. Vocês conseguem ver por si mesmos? Todos vocês, pensem por um tempo… Yama tem registrado tudo, não tem? Não há como vocês escaparem dele. Quer façam sozinhos ou em um grupo, em um campo ou onde quer que seja…
Tem alguém aqui que já roubou alguma coisa? Provavelmente há uns poucos entre nós que são ex-ladrões. Mesmo que não tenham roubado coisas de outras pessoas, vocês ainda podem ter roubado de vocês mesmos. Eu mesmo tenho essa tendência, por isso eu concluo que alguns de vocês possam ser do mesmo jeito. Talvez vocês tenham secretamente feito coisas ruins no passado, sem deixar que ninguém soubesse disso. Mas mesmo que não contem a ninguém sobre isso, vocês devem saber o que fizeram. É o Yama quem lhe observa e anota tudo. Aonde quer que vão, ele registra tudo em seu livro-caixa. Sabemos nossa própria intenção. Quando praticam más ações, a maldade está lá, se praticam boas ações, a bondade está lá. Não há lugar algum onde possam se esconder. Mesmo que os outros não lhes vejam, vocês devem ver a si mesmo. Mesmo se forem a um buraco profundo, ainda se encontrarão lá. Não há nenhum modo através do qual vocês possam cometer más ações e fugir disso. Da mesma forma, por que não deveriam ver a sua própria pureza? Vocês veem tudo – o pacífico, o agitado, a libertação ou a escravidão – vemos tudo isso por nós mesmos.
Nesta religião buddhista vocês devem estar conscientes de todas as suas ações. Não agimos como sacerdotes que visitam suas casas e dizem: “Que possam estar bem e felizes, que possam viver muito”. O Buddha não fala assim. Como a doença pode partir apenas com conversa? O modo do Buddha tratar do doente era dizer: “Antes de ficar doente, o que aconteceu? O que o levou a ficar doente?” E você diz a ele o que aconteceu. “Ah, é assim, não é? Pegue este medicamento e experimente”. Se não é o remédio certo, ele tenta outro. Se for adequado para a doença, então este é o certo. Este tratamento é cientificamente seguro. Quanto aos sacerdotes, eles somente amarram uma cordinha em torno do pulso e dizem: “Ok, fique bem, seja forte, quando eu sair deste lugar, levante-se, faça uma refeição saudável e sinta-se bem”. Não importa o quanto você os pague, sua doença não cessará, porque este tratamento não tem base científica. Mas isso é o que as pessoas gostam de acreditar.
Buddha não queria que acumulássemos muitas coisas desse gênero. Queria que praticássemos com um sentido. O Buddhismo existe há milhares de anos e a maioria das pessoas continua a praticar como os seus professores as ensinaram, independentemente de estar certo ou errado. Isso é estúpido. Apenas seguem o exemplo dos seus antepassados.
O Buddha não encoraja esse tipo de coisa. Ele queria que usássemos a razão. Por exemplo, numa vez em que ele estava ensinando aos monges, ele perguntou ao Venerável Sāriputta: “Sāriputta, você acredita nesse ensinamento?” O Venerável Sāriputta respondeu: “Eu ainda não acredito nisso”. O Buddha elogiou sua resposta: “Muito bem, Sāriputta. Uma pessoa sábia não acredita tão rapidamente. Ela observa as coisas, as suas causas e condições e vê a sua verdadeira natureza antes de crer ou descrer”.
Mas, hoje em dia, a maioria dos professores diria: “O quê?!!! Vocês não acreditam em mim? Vão embora daqui!” A maioria das pessoas tem medo dos seus professores. Qualquer coisa que seus professores façam, elas simplesmente seguem de maneira cega.
O Buddha ensinou a devoção à verdade. Ouçam o ensinamento e então reflitam sobre ele de forma inteligente, investiguem-no. Façam o mesmo em relação às minhas palestras de Dhamma – vão e reflitam sobre elas. O que eu digo está certo? Olhem realmente para elas, olhem dentro de vocês mesmos.
Então é dito para vigiar a sua mente. Qualquer um que guarde sua mente vai se livrar dos grilhões de Māra. É só a mente que segue e se agarra nas coisas, sabe coisas, experimenta felicidade e sofrimento… só essa mesma mente. Quando sabemos completamente a verdade das determinações e das condições sabemos naturalmente jogar fora o sofrimento.
Todas as coisas são como são. Elas não causam sofrimento por si só, assim como um espinho, um espinho bastante pontudo. Ele os faz sofrer? Não, ele é só um espinho, ele não incomoda ninguém. Mas se vocês pisarem nele, então ele irá fazê-los sofrer. Por que o sofrimento existe? Porque vocês pisaram no espinho. O espinho só está por aí levando a sua vida, ele não agride ninguém. Somente se vocês pisarem nele, vocês sofrerão. O sofrimento existe por nossa causa. Forma, sensação, percepção, vontade, consciência… todas as coisas nesse mundo simplesmente são. Somos nós que escolhemos lutar contra elas. E se as atingirmos, elas vão responder atingindo-nos. Se as deixarmos por sua conta elas não vão perturbar ninguém, só os bêbados arrogantes lhes podem causar problemas. Todas as condições evoluem de acordo com a sua natureza. Foi por isto que o Buddha disse: Tesam vūpasamo sukho: se subjugarmos as condições, vendo as nossas determinações e condições como são na realidade, como não sendo “eu” ou “meu”, “nós” ou “eles”, quando virmos que essas crenças são simplesmente sakkāya-ditthi, ficaremos libertos das condições que levam à auto-ilusão.
Se você acha que “é bom”, “é o máximo”, “é o melhor”, então está pensando de forma incorreta. Se você vê todos esses pensamentos simplesmente como determinações e condições, quando outros dizem “bom” ou “ruim”, você não dá a mínima importância. Enquanto você ainda mantiver “eu” e “você”, é como ter três ninhos de vespas: tão logo você fala qualquer coisa, elas vêm zumbindo para lhe picar. Esses três ninhos são sakkāyaditthi, viccikicchā e sīlabbata-parāmāsa [11].
Uma vez que observem a verdadeira natureza das determinações e das condições, o orgulho não pode prevalecer. Os pais dos outros são como nossos próprios pais, e as mães deles são como as nossas, os filhos dele são como nossos próprios filhos. Nós vemos que a felicidade e o sofrimento dos outros seres são as nossas.
Se consideramos dessa maneira ficamos face a face com o Buddha futuro, não é difícil. Todos estão no mesmo barco. Então, o mundo será suave como a pele de um tambor. Se quiserem ficar esperando para encontrar Phra Sri Ariya Metteyya, o Buddha futuro, então apenas não pratique… provavelmente vão ficar por aqui um tempo bem longo a ponto de vê-lo. Mas Ele não é louco de pegar pessoas assim como discípulos! A maior parte das pessoas apenas duvida. Se você não tem mais dúvidas acerca do eu, então não importa o que as pessoas digam sobre você, não vai lhe afetar, porque a sua mente soltou, ela está em paz. As condições se tornam subjugadas. Apego às formas de prática… o professor é ruim, aquele lugar não é bom, isto é certo, isto é errado … Não há nenhuma dessas coisas. Todo esse tipo de pensamento é suavizado. Você fica cara a cara com o Buddha futuro. Aqueles que apenas juntam as mãos e rezam nunca vão chegar lá.
Então, aqui está a prática. Se eu falasse mais seria apenas mais do mesmo. Outra conversa seria apenas o mesmo que esta. Eu trouxe vocês até aqui, agora pensem sobre isto. Trouxe vocês ao caminho, para quem quer que o siga, ele está aí para vocês. Aqueles que não vão segui-lo, podem ficar. O Buddha só o leva até ao início do caminho. Akkhātaro Tathāgatā – o Tathāgata apenas indica o caminho. Para a minha prática, ele só ensinou isso. O resto era comigo. Agora eu ensino a vocês, e eu posso dizer-lhes apenas isto. Posso levá-los apenas ao início do caminho, quem quiser voltar pode voltar, quem quiser viajar pode viajar nele. Agora, cabe a vocês decidirem.
Notas:
[1] Dada em uma noite de observância lunar (Uposatha) at Wat Pah Pong, 1976.
[2] Dias de Uposatha (ou observância) são aqueles em que buddhistas praticantes vão ao monastério praticar meditação, ouvir palestras sobre o Dhamma e manter os oito preceitos uposatha – evitar matar, roubar, qualquer atividade sexual, mentir, intoxicar-se, alimentar-se depois do meio-dia, divertir-se, além de vestir-se e sentar-se ou deitar camas ou cadeiras luxuosas.
[3] Kusala: ações ou estados mentais benéficos ou saudáveis.
[4] Pariyatti, os ensinamentos dispostos nas escrituras, ou transmitidos de uma pessoa a outra de algum modo; o aspecto “teórico” do Buddhismo. Pariyatti é frequentemente mencionado em relação a dois outros aspectos do Buddhismo: patipatti, a prática, e pativedha, a realização. Assim: Estudo – Prática – Realização.
[5] Sammuti sacca, um termo difícil de traduzir. Refere-se à realidade dualista ou nominal, a realidade das convenções, determinações ou nomes. Por exemplo, um copo não é intrinsecamente um copo, apenas simplesmente foi denominado assim.
[6] “Cessação é a verdadeira felicidade” ou “o acalmar das condições é a verdadeira felicidade”.
[7] Os cinco khandhas.
[8] O Cânone Buddhista Pāli.
[9] A terceira das “Três Cestas”, o Tipitaka, sendo a seção da filosofia superior do Buddhismo.
[10] A frase pāli no final do oferecimento tradicional dos preceitos.
[11] Noção de eu, dúvida e apego a ritos e práticas.
Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda
com a permissão dos detentores do copyright
© 2014 Edições Nalanda
Nota: “Os Ensinamentos de Ajahn Chah” consiste de uma coletânea de ensinamentos dados por um dos mais importantes mestres da tradição das florestas da linhagem Theravada da Thailândia.
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Grato
Excelente texto, muito esclarecedor. Grato pelo compartilhamento.
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