II. RELIGIÃO E CIÊNCIA
Dos inícios comuns à separação
Como a religião surgiu? Todos aprendemos que a religião surgiu do medo em relação ao perigo, particularmente dos perigos naturais, como relâmpagos, inundações, terremotos, erupções vulcânicas, furacões etc. Esses perigos sempre ameaçaram os seres humanos.
Antigamente, os homens não entendiam o funcionamento da natureza e eram ignorantes a respeito das causas dos fenômenos. Apavorada com a força da natureza, a humanidade começou a procurar por respostas. Essa questão precipitou um interesse na natureza que a cercava, e um desejo por encontrar uma maneira de lidar com ela. Esse é um ponto importante, porque é a origem comum de ambos, religião e ciência. A religião nasceu de um desejo para escapar do perigo, enquanto a ciência, como já mencionamos, nasceu de um desejo de conhecer a verdade sobre a natureza.
No caso da religião, o desejo por segurança foi o incentivo. Existe perigo no mundo natural, e assim a humanidade voltou-se para a natureza em busca de uma resposta prática. Ao mesmo tempo, havia um sentimento de admiração diante das maravilhas da natureza, a partir do qual surgiu o desejo de conhecer suas verdades. Isso não era mera curiosidade: os seres humanos foram forçados a descobrir sobre a natureza, a fim de enfrentar os perigos que os ameaçavam.
A partir da aspiração de estar livre do perigo, que se baseou no medo, também surgiu o desejo de conhecer as verdades da natureza. Neste ponto, podemos ver uma fonte comum para a ciência e a religião: a religião surgiu primeiro, no medo do perigo, enquanto o desejo de conhecer as verdades da natureza, que era a ciência, se seguiu.
Até onde sabemos, as mais remotas formas de pesquisa científica surgiram, de fato, da religião. As pessoas que buscavam o conhecimento científico no Egito, Mesopotâmia e outras culturas antigas, pertenciam a círculos religiosos. Essas foram as primeiras pessoas a terem interesse em estudar a natureza e dedicar tempo a procurar soluções para os perigos que as ameaçavam. Isso indica que ciência e religião originaram-se juntas.
Esta origem comum da ciência e da religião é também o ponto em que ambas se separaram. Por que elas se separaram? A resposta está na própria natureza da verdade.
Os perigos naturais que ameaçam a humanidade são preocupações imediatas, questões de vida e morte. A ameaça é imediata, aqui, diante de nós. Façam o que quiserem, devemos buscar uma resposta agora. E todas as pessoas se confrontam igualmente com os mesmos perigos. A resposta deve ser relevante para o grupo, para o todo da sociedade. Em tal situação, é necessário apresentar uma resposta que possa ser operacionalizada imediatamente, algo que ponha um fim nessas demandas urgentes. Quando uma resposta que é aceitável aparece, ela é institucionalizada como religião.
As respostas práticas assim providas podem assumir formas, tais como cerimônias místicas, que para o olho moderno podem parecer absurdas, mas mesmo assim, são algo que pode ser posto em prática imediatamente. Para a maior parte da sociedade, isto é o que se torna religião.
Agora existe outro grupo, que talvez tenha surgido do primeiro grupo, mas num momento onde a ameaça iminente já havia passado e havia tempo para, gradualmente, coletar os fatos, analisar e experimentar. Esse grupo de pessoas chega a um diferente conjunto de respostas, respostas estas que são resultados de observação e experimentação. Isso é o que ficou conhecido como “ciência”, o conhecimento que vem da observação gradual e sistemática.
Esse é o ponto de divergência entre religião e ciência. A resposta que serviu como um remédio para uma necessidade imediata para as massas, carecia de observação sistemática, e dependia fortemente de fé e de crença. Isso era religião. Religião, então, está ligada à fé.
A ciência, por outro lado, é uma disciplina de investigação gradual e sistemática. Ela não estava preocupada em encontrar respostas imediatas, e estava disponível apenas para os poucos que tinham vocação, e não para toda a sociedade. Por esta razão, houve indivíduos ou grupos que conduziram esta observação sistemática, utilizando métodos que podiam ser comprovados, e isso se tornou conhecido como “ciência”.
Nessa intersecção temos uma clara distinção entre religião e ciência: religião é para as massas, para sociedades ou grupos como um todo, ao passo que ciência é para um número mais limitado de pessoas. Agora, o problema que aqui surge é: como a religião mantém a uniformidade com este número limitado de pessoas, bem como a prática de seus ensinamentos? Isso é atingido por meio da fé. A religião tem suas raízes na fé, e a utiliza para manter a sua essência, provendo um imutável sistema de crença, ao qual se deve aderir e se manter, que é inquestionável. No ocidente, isso se chama Dogma.
A ciência se limita às pessoas com as quais ela se comunica, os pensadores. Eles preservam a essência da ciência por meio de verdades verificáveis, através de métodos válidos de experimentação. A ciência, assim, preserva e propaga suas verdades através de sua sabedoria, ou, para ser mais específico, através do método científico.
A religião busca expor uma verdade absoluta, que abarca tudo, uma resposta endereçada a uma necessidade imediata. Provavelmente seria mais acurado dizer não que a religião ofereça essa resposta, mas que a resposta assim oferecida é o que se torna conhecida como religião. Não é que haja uma instituição já existente chamada religião, que produz essas respostas, mas, antes, essas respostas, propostas pela humanidade, tornaram-se institucionalizadas como religião. A resposta é proposta pelas pessoas, ou por uma pessoa, e à medida que o tempo avança, essas pessoas se reúnem com outras e uma instituição se forma, com o propósito de preservar o ensinamento. Assim, temos as formas institucionais de religiosos, tais como mendicantes, sacerdotes, monges, etc.
Visto dessa maneira, a religião procura fornecer uma resposta absoluta, responder as questões fundamentais da vida, abrangendo tudo, das maiores às menores. Por outro lado, a ciência tenta observar a verdade a partir de suas manifestações, peça por peça. Ela é uma coleção de partes, verdades parciais que gradualmente tentam construir um quadro inteiro.
Embora a ciência também queira chegar a um princípio geral, o seu princípio fundamental é condicional, limitado às situações e condições específicas, e é apenas uma parte da verdade geral ou fundamental. Para usar uma frase provocante, poderíamos dizer que a religião dá uma resposta total, a ciência uma fragmentada.
Neste ponto, gostaria de acrescentar que, devido às limitações da religião e da ciência, surgiu um terceiro grupo, insatisfeito com ambas. Esse grupo também queria uma resposta para as questões fundamentais da vida e do universo, uma resposta absoluta, mas eles estavam insatisfeitos com a religião, porque, embora ela tenha dado tal resposta, esta não se baseava na razão. Tal resposta baseava-se na fé. Mas quando eles se voltaram para a ciência, embora suas respostas fossem verificáveis e baseadas na razão, essas respostas não eram absolutas. A investigação ainda não tinha atingido o nível fundamental da realidade.
Esse grupo não quis esperar pelas respostas da ciência, então seus membros tentaram encontrar respostas para essas questões fundamentais por meio de considerações racionais, sem a necessidade de verificação. Esse sistema de pensamento tornou-se outra ciência, conhecida como “filosofia”. Podemos comparar estas três disciplinas com as questões fundamentais da natureza, dessa maneira:
- Ciência: está no processo de verificação e de observação e ainda não encontrou uma resposta.
- Filosofia: tenta dar uma resposta no lugar da verificação usando a ferramenta de análise fundamentada.
- Religião: proporciona uma resposta total que não precisa de verificação.
Tanto a ciência quanto a filosofia surgiram depois da religião, e ambas tentaram propor respostas mais claras que as da religião. No entanto, falharam em dar respostas satisfatórias e completas de um modo geral, o que explica o fato de a religião ainda existir e propor respostas baseadas na fé. Diversas religiões, uma ciência.
Tendo visto algumas das diferenças entre religião e ciência, eu gostaria de fazer algumas observações sobre esta diferença.
Porque a religião oferece esta verdade que é abrangente e imediata, uma resposta que é adequada para as massas, mas que, ao mesmo tempo, não é verificável através de nenhum dos cinco sentidos, ela deve depender da fé. Porque essas respostas não são verificadas, estarão em constante crescimento. Num determinado momento, um tipo de resposta é apresentado. As pessoas não sabem se é verdadeira ou não, pois não pode ser verificada. Se elas acreditam nela, elas a aceitam. Num momento posterior uma nova resposta é dada. Ninguém sabe se essa nova resposta é verdadeira ou não, ela também não pode ser verificada. Tudo se resume a preferência. Alguns podem preferir a crença mais antiga, outros a mais nova. Religiões, baseadas com são na fé, variam de acordo com essa fé. Por essa razão nós podemos ver num mesmo momento diferentes religiões.
Por que isso? Porque esta é a natureza de tais respostas. A resposta que tudo aceita, a resposta absoluta deve ser assim. Ela não pode ser verificada, é uma crença absoluta. Quando uma nova resposta surge, alguns acreditarão, mas todas as respostas são igualmente não verificáveis.
Por outro lado, a ciência responde lenta e metodicamente, verificando cada ponto. Ela resolve os problemas de forma inteligente. Em qualquer momento, há apenas uma ciência. Então, nós encontramos pessoas dizendo: “Há muitas religiões, mas apenas uma ciência”.
No entanto, olhando de uma perspectiva histórica, constatamos que existem muitas ciências, porque a ciência não concede uma visão total da verdade. Podem existir muitas religiões ao mesmo tempo, mas de uma perspectiva histórica, há muitas ciências. As teorias sobre a natureza do universo variam de tempos a tempos. Um conjunto de respostas científicas pode parecer correto em um momento, mas em um momento posterior é provado estar errado. Conforme o tempo passa, essa nova resposta, que a princípio estava certa, é por sua vez provada errada. Uma nova imagem está constantemente se desdobrando.
Numa época, a ciência seguiu o sistema ptolomaico, que mostrou um universo como postulado por Ptolomeu (geocêntrico). Então, veio o sistema copernicano (sistema solar heliocêntrico), seguindo o modelo de Copérnico; aí então vieram os sistemas cartesianos e newtonianos, e agora temos o universo da nova física. A imagem da ciência a respeito da realidade está constantemente mudando. A Natureza, ou o Universo, de acordo com as teorias modernas da física, seja as teorias quânticas ou da relatividade, é completamente diferente do universo no tempo de Newton. De forma que tem existido muitas ciências através dos tempos.
Além disso, não só tem havido várias ciências através dos tempos, como parece que, nos tempos atuais, temos muitas ciências existindo conjuntamente. Há até cientistas que dizem que chegou a hora para a ciência mudar algumas de suas premissas básicas. Esses cientistas rejeitam algumas das antigas premissas científicas e falam de uma “nova física” e de uma “nova ciência”, indicando que não há mais apenas uma ciência.
Ainda agora, eu mencionei que a ciência lida com o mundo externo, mensurável pelos cinco sentidos. Nesse sentido, a religião tem ainda outra característica especial. A religião não só lida com o mundo externo como também se preocupa com o ser humano, com aquele que está observando. A ciência se ocupa exclusivamente com os objetos de observação, mas a religião se ocupa com o observador, aquele que está usando as bases dos sentidos. A religião não está confinada aos cinco sentidos, mas está diretamente relacionada com o nível de desenvolvimento de cada indivíduo. A maneira como a religião é percebida está diretamente relacionada ao nível de desenvolvimento mental de quem observa, o que adiciona um nível a mais de complexidade.
Em qualquer dos casos, tanto quanto a religião permite, ainda que dê ênfase aos seres humanos, ela o fará somente quando o ser humano estiver experienciando um problema, e o problema precisa ser abordado. Quando olhamos para as causas e os fatores desse problema, no entanto, a maioria das religiões vai em busca da sua fonte, como a ciência o faz, no mundo físico externo.
Neste aspecto, a maioria das religiões não difere da ciência: olham para a natureza externa do mundo como a fonte dos problemas, a fonte do sofrimento. A busca pela verdade empreendida pela religião ocorre por forma a resolver o problema humano, enquanto a pesquisa científica procura a verdade por forma a satisfazer a sede de conhecimento.
Para a maioria das religiões, as quais são forçadas a ter uma resposta pronta, a causa dos problemas, sejam eles internos ou externos, é vista como se existisse por trás do mundo natural, na forma de espíritos, divindades, deuses ou outras forças sobrenaturais. Para perturbações externas, tais como relâmpagos, terremotos e assim por diante, sacrifícios e orações a essas forças são prescritos. Para distúrbios internos, sejam eles enfermidades, doenças mentais ou histeria, médiuns ou curandeiros espirituais realizam cerimônias místicas. A ciência, não sendo obrigada a encontrar respostas imediatas, lenta e sistematicamente sai em busca de dados.
As religiões naturais, o Buddhismo em particular, além de terem um interesse especial na condição humana, não veem a fonte dos problemas como sendo inteiramente exterior, no mundo físico. Este tipo de religião procura a fonte dos problemas dentro do processo de causas e condições como um todo, incluindo aquelas no interior do ser humano, tais como maneiras erradas no modo de vida – sejam elas internas ou externas, materiais ou imateriais, físicas ou mentais.
Entre religiões comuns, existem muitas que ensinam o tratamento dos problemas por meios apropriados, através da moral ou ética, o que parece indicar uma compreensão dos fatores internos que contribuem para o problema, mas este não é necessariamente o caso. Na verdade, tal prática muitas vezes não é feita com real compreensão desses fatores, mas por obediência a alguma força sobrenatural externa. O relacionamento é aquele entre a humanidade e um poder externo. O comportamento ético nessas religiões geralmente é realizado a fim de evitar a punição ou para obter favores ou bênçãos, em vez de por meio da conscientização dos fatores que ocorrem nos processos naturais.
A dada altura, as muitas e variadas religiões têm em conta as necessidades de diferentes categorias de pessoas. Em determinada altura, a sociedade abrange diferentes níveis de virtude e entendimento, daí a necessidade de muitas religiões, respondendo aos vários níveis de necessidade.
No passado, a verdade da ciência era verificável por meio dos cinco sentidos, mas isso não é mais o caso. Inicialmente a observação foi realizada com estes cinco sentidos próprios – a olho nu, a orelha nua, diretamente com a mão e assim por diante. Conforme o tempo passou, tornou-se necessário o desenvolvimento de instrumentos, tais como o telescópio e o microscópio, para estender as capacidades desses sentidos. Eventualmente, até mesmo esses instrumentos atingiram os seus limites, tornando necessário que os cientistas desenvolvessem instrumentos ainda mais complexos até que, finalmente, fez-se necessário testar hipóteses pela matemática. Linguagens matemáticas tornaram-se o instrumento de verificação. No presente momento isso foi estendido para incluir o uso de computadores.
O desenvolvimento de meios cada vez mais complexos de verificação, utilizados pela ciência, fez surgir outra característica que a distingue da religião. A verificação e a observação da ciência transformaram-se em um campo especializado, acessível apenas a um grupo seleto. Tornou-se impossível, para o homem comum, observar as verdades da ciência, porque os instrumentos não estão disponíveis para ele. A ciência tornou-se um assunto altamente restrito.
A religião pertence às massas. Está disponível para o homem comum que é livre para aceitar ou rejeitar sem necessidade de provas. Apesar de ser verdade que algumas religiões, como na ciência, reservam as suas verdades para alguns (padres ou monges) ou, mesmo, reservam a eles o direito às conquistas espirituais, isso é algo que é mais resultado de manipulações de certos indivíduos. Nas religiões naturais, como o Buddhismo, não existe tal distinção ou exclusão, porque a natureza é o seu mestre. Como pode haver lugar a monopolização? É o direito de cada individuo de entender e alcançar as verdades da natureza, dependendo da sua inteligência e discernimento.
Note que há dois tipos de impossibilidade de verificar a verdade. Um é a impossibilidade de acessar os instrumentos de verificação e o outro é porque tais verdades não podem ser verificadas através do meio utilizado. Atualmente, a ciência tem dificuldades em ambos os casos, especialmente quando tenta fazer afirmações definitivas sobre a verdade ou mergulha no domínio da mente.
Se a ciência não expandir seus horizontes, ela vai chegar num beco sem saída. A ciência possui uma fortíssima aspiração para responder as questões fundamentais e últimas do universo, mas nunca parece estar perto delas. Assim que aparenta estar próxima de uma resposta, a verdade parece escorregar para além do seu alcance.
A clareza que não é livre de confusão
Hoje em dia estamos começando a ver diferentes tipos de ciência existindo simultaneamente. Além da nova ciência e da ciência clássica, ou da nova física e da física clássica, temos uma ciência para os especialistas e uma para o homem comum. Isto porque muitos dos conceitos mencionados na ciência estão completamente além da capacidade de visualizar do homem comum. Não só ele não pode verificar por si mesmo, como ele não pode nem mesmo entender os conceitos como um todo. E isso se aplica não só ao homem comum: alguns dos conceitos da ciência estão para além mesmo da capacidade de visualizar da maioria dos cientistas! Só podemos aceitar suas palavras.
Tomemos um exemplo. De acordo com a ciência, a luz é, ao mesmo tempo, onda e partícula. Cientistas tentavam definir a natureza da própria luz: onda ou partícula? É um componente, uma partícula, certo? Um grupo disse: “Sim, está correto. É uma partícula, uma corrente de prótons”. Mas outro grupo disse: “Não, a luz é uma onda”. No fim das contas, parece ser ambas… A luz é tanto partícula quanto onda. Humm. Mas o que é isso? Isso tem de ser provado matematicamente. Esse tipo de coisa está além da compreensão do ser humano comum.
Vejamos mais alguns exemplos. Pegue os buracos negros. Por enquanto, os astrônomos nos dizem que há buracos negros espalhados por todo o universo. São estrelas a partir das quais nem a luz pode escapar, elas são absolutamente escuras. Na verdade, nada pode escapar de suas altíssimas forças gravitacionais. Até mesmo a luz não pode escapar elas. Agora, o que o homem comum pode fazer disso? Algo de que nem a luz pode escapar?!
Agora eles dizem que nesses buracos negros matéria e energia estão compactadas em densidades incríveis. Não há nada comparável a isso em nossa Terra. Para dar uma ideia, eles dizem que se todo o espaço vazio de um arranha-céu fosse assim pressionado, de um prédio tal como o Empire State Building, 102 andares de altura, então sua massa e energia seriam compactadas ao tamanho de uma agulha! Um arranha-céu! Tirem todo o espaço vazio dele e o que fica é do tamanho de uma agulha. Agora, o que os aldeões vão entender e fazer com isso?
Os cientistas dizem que isso é como um buraco negro. De fato, isso é mesmo estranho porque, além de ser do tamanho de uma agulha, ao mesmo tempo ele ainda pesaria tanto quanto o Empire State Building original. Isso é inconcebível – tudo o que podemos fazer é acreditar neles. Temos confiado nos cientistas por tanto tempo, nós damos a eles o benefício da dúvida. Mas bem lá no fundo, nós todos estamos nos perguntando: “Oh, será possível?”.
A ciência ainda não é capaz de fornecer uma resposta que explique a totalidade da vida e do mundo, ainda está envolvida no processo de recolhimento e de verificação de pedaços de dados. A ciência ainda não é capaz de explicar muitas das questões básicas do universo, como a natureza, ou mesmo a existência, da partícula base.
A ciência foi além do ponto no qual algo pode ser comprovado com os cinco sentidos. Hipóteses são comprovadas através da matemática, que, depois, é interpretada pelos físicos. A verdade é reduzida a equações algébricas, que não são em si mesmas a verdade, e realmente não explicitam a verdade de uma forma convincente. Tornou-se uma questão de crença nesses símbolos matemáticos. Estes símbolos são interpretados sem uma percepção direta da realidade, que é praticamente a condição da qual falava Sir Arthur Eddington.
Sir Arthur Eddington foi um cientista inglês, conhecido por ter sido a primeira pessoa a entender completamente a Teoria da Relatividade de Einstein. Ele foi também a primeira pessoa a indicar uma maneira de provar a Teoria da Relatividade, e por isso recebeu o título de cavalheiro. Sir Arthur Eddington, que foi o principal cientista nessa área, uma vez disse:
“A ciência não consegue conduzir a humanidade diretamente à verdade ou à realidade como tal. Ela pode apenas conduzi-la a um obscuro mundo de símbolos”.
Essas são suas palavras, “um obscuro mundo de símbolos”, um mundo de símbolos e de sinais. Essas são as palavras de um dos cientistas proeminentes do mundo.
Mesmo fenômenos observáveis não são uma certeza. Cientistas usam o método científico como um meio de testar suas observações e experimentos, que devem ser realizados até não haver mais espaço para dúvida. Mas, ainda assim, o assunto não está encerrado por causa das limitações do método experimental e dos instrumentos usados.
Vamos tomar como um exemplo a Lei da Gravitação de Newton. Foi uma verdade universalmente aceita, uma lei, mas Einstein apurou e disse que não estava inteiramente correta. No nível subatômico, a Lei da Gravidade não se aplica, mas no tempo de Newton não havia instrumentos para observar o nível subatômico. A humanidade teve que esperar até o século vinte e o surgimento de Einstein, que usando equações matemáticas e raciocínio, permitiu chegar a essa verdade. Então devemos ser cuidadosos. Não podemos de modo derradeiro acreditar mesmo na experimentação.
Neste ponto gostaria de inserir um pouco de história usada para provocar os cientistas. É a história do frango e do fazendeiro Brown. Cada manhã que o frango via o fazendeiro Brown, ele estava carregando algum alimento para ele. O frango observa isso ocorrer toda manhã, então, decorre-se que quando quer que veja o fazendeiro Brown o significado disso é que ele, o frango, será alimentado. O frango vê o fazendeiro Brown = receber comida… essa é a equação. Mas chega uma manhã em que o frango vê o fazendeiro Brown e não é alimentado porque o fazendeiro Brown não está carregando alimento em sua mão, está com uma faca. A equação “frango vê o fazendeiro Brown = ser alimentado”, se torna “frango vê o fazendeiro Brown = tem o pescoço cortado”. Então, parece que mesmo a verificação baseada em observação repetida não pode ser completamente confiável, ainda não é uma certeza.
O que gostaria de destacar aqui é que a ciência tem se distanciado mais e mais da pessoa mediana devido a sofisticação de seus métodos experimentais. Cientistas se tornaram um grupo muito seleto, uma elite, aqueles que se tornaram altamente especializados, enquanto que a religião está disponível às massas. Essa é a maior diferença entre as duas disciplinas.
Em direção à unidade entre ciência e religião
Ciência é de pouco uso direto para as massas. A função por meio da qual a ciência deve realmente ajudar as pessoas é no campo do entendimento, mas o papel que seu efeito desempenha é amplamente por meio da tecnologia, que não melhora o entendimento por qualquer forma.
Em que direção a tecnologia auxilia a humanidade? Principalmente no consumo, muitas vezes nutrindo seja a avidez (lobha), o ódio (dosa) ou a ilusão (moha). A televisão é inventada e assim a assistimos. Mas quando as pessoas assistem televisão, elas não buscam por coisas que irão aumentar seu entendimento e inteligência, elas procuram por coisas que as façam ainda mais negligentes e indiferentes. Temos tecnologia de comunicação, mas ela não é usada para desenvolver sabedoria e discernimento, mas frequentemente para encorajar a ilusão.
A ciência não parece tomar responsabilidade por essas coisas, se livrando de qualquer posicionamento e deixando a tecnologia ajudar as massas. Tecnologia, entretanto, nem sempre ajuda; às vezes é um dano descarado. Como disse, ao invés de se tornar uma ferramenta para criar benefício, se torna uma ferramenta para buscar benefício. Então, a ciência deixa as pessoas nas mãos da religião. Quem você vai acusar? Alguém poderia perguntar: “Por que a religião faz as pessoas tão crédulas e estúpidas?”, mas então isso pode ser rebatido: “Por que a ciência abandona as pessoas à religião?”
A ciência se tornou um assunto que somente muito poucos podem se aproximar. Tudo o que as pessoas podem fazer é acreditar nela, não podem realmente conhecê-la. Atualmente a ciência se tornou mais e mais uma matéria de crença ou de fé, não de conhecimento, o que a posiciona no mesmo patamar da maior parte das religiões.
Neste momento, os EUA ainda se deparam com o problema do “cientificismo”, a fé cega na ciência. Ciência é o oposto direto de credulidade, lida com conhecimento e com a verificação fundamentada e sistemática de verdades, mas nos dias de hoje as pessoas se tornaram crédulas em relação à ciência. Os cientistas devem aceitar alguma responsabilidade por essa situação porque são seus deveres comunicar conhecimento para a humanidade, mas nos dias atuais as pessoas se relacionam com a ciência de modo crédulo, às vezes beirando a tolice. Sem conhecer ou verificar as verdades da ciência, simplesmente acreditam nelas.
Antes de prosseguir, a partir daqui gostaria de oferecer uma reflexão sobre o argumento: “Existem muitas religiões, mas somente uma ciência”.
Primeiramente, a presença de muitas religiões, mas apenas de uma ciência em qualquer dado momento é um fenômeno natural, surgindo naturalmente por conta da natureza humana. Essa condição é portanto a ciência. Colocando de outra forma, ciência, como a compreensão e o conhecimento do modo natural das coisas, deve também entender essa situação.
Em segundo lugar, a existência de muitas religiões lado a lado com a ciência indica que a ciência está ainda inapta para satisfazer a aspiração mais elevada da humanidade, para responder às questões fundamentais do universo ou obter uma descrição completa da natureza da realidade. A ciência não está ainda completamente desenvolvida, e por esse motivo as religiões ainda são requeridas para preencher uma necessidade, mesmo se somente provisoriamente, que não é satisfeita pela ciência.
Em terceiro, quando a ciência estiver finalmente apta para chegar à verdade, respondendo às questões últimas da humanidade, ela será uma ciência perfeita. Muitas religiões não mais serão sustentáveis. Ao contrário, qualquer religião que estiver apta a mostrar a verdade mais elevada, para conduzir a humanidade para a realidade, estará em posição de se unificar com a ciência, se tornando uma e o mesmo corpo de conhecimento. Ao mesmo tempo, a ciência e a religião terão alcançado outro ponto de encontro, seu último, onde religião se torna ciência e ciência se torna religião, a divisão entre as duas abandonada para sempre.
Quando a fé na ciência é abalada, mesmo assim a adoração à religião floresce
Gostaria de mais uma vez resumir neste ponto que os problemas da vida em sociedade precisam de uma resposta imediata ou um remédio – agora, nesta vida presente. Enquanto indivíduos só estamos nesta terra por um tempo limitado, não podemos esperar. As situações que nos ameaçam não permitem adiar para outro momento.
Embora a ciência seja capaz de prover muitas maneiras eficientes de responder aos nossos problemas, ela é enfraquecida por ser ‘ muito insuficiente, muito tardia’.
Ao dizer que a ciência é ‘muito insuficiente’, quero dizer que o conhecimento da ciência não é o bastante para solucionar os problemas fundamentais da vida. Não pode fazer as pessoas boas, não pode deixá-las felizes, não pode mostrar a elas como mudar hábitos prejudiciais, não pode solucionar o sofrimento, a tristeza, o ódio, o arrependimento, a depressão e assim por diante. Não pode nem mesmo solucionar os problemas sociais.
Respondendo a isso, cientistas podem contra-argumentar que a ciência tem ajudado de diversas formas. Pessoas com insônia, depressão e problemas mentais são todas auxiliadas por drogas. A ciência é de grande benefício nessas áreas. A ciência aplicada e a tecnologia de campos médicos têm ajudado um vasto número de pessoas. E este ponto deve ser reconhecido. Pessoas com problemas mentais severos são realmente ajudadas em algum grau pela ciência.
Os cientistas podem acreditar que no futuro será possível fazer as pessoas felizes através do uso de drogas. Quando quer que se sinta infeliz, só tome uma cápsula e já era… mas aí não é mais remédio, é a busca pelo prazer. Os cientistas podem conduzir pesquisa na natureza do cérebro, descobrindo que compostos químicos específicos são secretados quando certas emoções, tal como a felicidade, são experienciadas. Quando conseguirem isolar o agente químico poderão sintetizá-lo. A qualquer momento que existir um sentimento de depressão ou tristeza, as pessoas poderão tomar essa droga e ter um alívio imediato. Parece que a ciência pode fazer qualquer coisa, talvez mesmo solucionar todos os problemas do mundo. Se puder fazer as pessoas felizes, então as pessoas não mais terão que temer a depressão ou a tristeza. Com químicas como essas tão livremente disponíveis como os alimentos, as pessoas sempre terão felicidade e nunca terão que experimentar a depressão.
Mas, então, mais uma vez, refletindo sobre os perigos dos químicos, vemos que o mundo já é uma bagunça, com aditivos alimentares e pesticidas, sem adicionar nada mais. Entretanto, não é o ponto mais importante. Ainda mais importante é a perspectiva de valores ou qualidade de vida. O objetivo da religião é conduzir as pessoas à liberdade. Liberdade aqui significa a habilidade de ser feliz sem a necessidade de agentes externos, ser mais e mais independentemente feliz e menos e menos dependente de incrementos, para desenvolver uma vida livre da escravidão de armadilhas externas. Mas o uso de drogas força pessoas a colocar sua felicidade e destino mais e mais nas mãos de fatores externos, fazendo-as menos e menos capazes de viver com elas mesmas.
Se a ciência fizer com que as pessoas dependam cada vez mais de coisas externas, ela não será muito diferente de religiões antigas, que conduziam as pessoas a investir seus destinos nos deuses, por meio de sacrifícios e súplicas. Em ambos os casos, a felicidade e o sofrimento dos seres humanos são oferecidos às mãos de agentes externos, num caso pelo oferecimento de coisas materiais, e no noutro por uma qualidade nominal, mas na essência igualmente destruidoras da independência do homem.
Se as coisas alcançarem esse estágio podemos desistir de fingirmos ser seres humanos. Se for esse o caso não mais seríamos seres humanos naturais, mas seres científicos, artificiais ou algum outro tipo de ser que é insustentável num ambiente natural.
O que eu mencionei é um exemplo do que quero dizer por ‘muito insuficiente’. A ciência por si só não é capaz de solucionar os problemas da humanidade. Para usar a terminologia buddhista, poderíamos dizer que a ciência e a tecnologia não encorajam as pessoas a terem uma boa conduta (sīla), não encorajam a qualidade na mente ou um bem-estar interno (samādhi) e sofrem com a ‘visão de funil’, em que buscam informação de massa, mas não nos oferecem o conhecimento de como levar uma vida feliz (paññā) (x)
(x) Sīla, Samādhi e Paññā, ou contenção moral, concentração e sabedoria, é uma fundação tripla da prática ética buddhista.
A segunda objeção que temos com relação à ciência é que é ‘tão tardia’, não podemos esperar por ela. A verdade científica não é total ou completa. Não está ainda apta a nos fornecer uma resposta definitiva e final, e não há uma indicação de quando isso irá acontecer. O conhecimento científico está constantemente mudando. Num momento a verdade é de um jeito, mais tarde se descobre que é de outro.
A verdade parece estar sempre mudando. Se estivermos sentados e esperarmos pela ciência para chegar a uma conclusão final sobre a natureza do Universo, todos nós morreríamos primeiro sem nunca ter descoberto como conduzir nossas vidas.
Os cientistas estão sempre buscando por um princípio geral, mas qualquer princípio a que chegam é sempre um ‘sub-princípio’, apenas uma peça de um quadro geral. Enquanto isso, à medida que a ciência é incapaz de dar uma explicação da verdade fundamental, seguimos utilizando-a, por meio da tecnologia, para melhorar nossas vidas e atender aos nossos desejos. Por agora, o que está ajudando a humanidade é a tecnologia, que no mínimo pode ser usada para alguma coisa, ao invés da ciência em si mesma. Mas a tecnologia não pode responder aos problemas fundamentais da humanidade. Para uma resposta para a verdade (ou não verdade) do mundo natural, a humanidade deve primeiro confiar na religião, usando a ciência apenas como conveniência oferecida vinda do progresso tecnológico. Esta é a situação no momento presente.
Por que os seres humanos ainda precisam de religião? Por que a religião ainda está presente neste mundo? Porque a humanidade ainda está esperando por uma resposta completa e absoluta, algo que está certo para a situação e que é imediatamente viável. E porque não pode ser verificada e porque a ciência não pode verificar isso por si, ela precisa recorrer à crença.
Embora a ciência tenha produzido grandes avanços, tudo o que tem feito é expandir os limites perceptíveis do mundo material, fazendo isso de modo mais e mais complexo e intricado. Mas em termos de responder às perguntas fundamentais da humanidade, mostrando o relacionamento apropriado do homem e sua posição no mundo, parece que a ciência tem rodado em volta de um ponto e não tem feito progressos reais.
Não acima de erros
Não é só no campo da Ciência Pura que o problema de erros surge de tempos em tempos. Mesmo dentro da Ciência Aplicada e da tecnologia, enganos são comuns. Frequentemente não são irregularidades, mas erros que surgem da ignorância, descuido ou falta de precaução.
Tomemos por exemplo a droga cloranfenicol. No passado, essa droga era muito difundida. Era uma droga milagrosa, parecia curar tudo. As pessoas estavam realmente convencidas disso, pensávamos que íamos ficar livres das doenças para sempre. Assim que ficasse doente, tudo o que tinha que fazer era ir comprar cloranfenicol. Vendiam em toda parte. Posteriormente, depois de dez anos, foi descoberto que essa droga gradualmente se acumulava no sistema, onde fazia com que a medula óssea parasse a produção de glóbulos sanguíneos e muitos tinham morrido de leucemia.
Então chegou a vez do DDT. Naquele tempo, se pensava que com o DDT, nossos problemas com o mundo dos insetos estavam acabados – formigas, mosquitos… tudo acabado. Pensávamos que poderíamos erradicar essas criaturas e não sermos mais incomodados por elas.
Muitos anos depois foi descoberto que DDT era carcinogênico, uma substância traiçoeira que poderia se mostrar fatal para os humanos. Além disso, enquanto humanos estavam sofrendo efeitos maléficos da droga, a população de insetos estava se tornando imune a ela. Num momento se tornou sem utilidade como inseticida enquanto continuava a matar os seres humanos. Muitos países baniram o uso de DDT, mas a Tailândia continuou utilizando, ainda hoje.
Aí também houve o caso da talidomida. A talidomida era um analgésico e tranquilizante muito admirado pela profissão médica. Tinha uma reputação que passava pelos testes mais rigorosos e era tão confiável que era apresentada como uma droga excepcionalmente segura. Era tão louvada que mesmo os países desenvolvidos, que são normalmente muito cuidadosos com drogas e medicamentos, permitiram que a droga fosse comprada sem prescrição. Foi vendida por mais ou menos cinco anos, até 1961, quando foi descoberto que essa droga, quando tomada por mulheres grávidas, gerava bebês deformados. Antes que esse perigo fosse conhecido e a droga fosse recolhida do mercado, aproximadamente 8000 crianças deformadas nasceram.
Vamos pegar mais um exemplo, o caso do CFC (clorofluorocarboneto). Esse grupo de químicos é amplamente usado em refrigeradores, ar condicionados e embalagens de pressão em latas de spray. Esses químicos têm sido usados por um logo tempo com completa confiança. Antes que soubéssemos o que estava acontecendo, acabou que esses químicos subiram até os níveis superiores da atmosfera e provocaram buracos na camada de ozônio. Um bocado já tinha se prejudicado e os cientistas estão muito preocupados; conferências mundiais então sendo realizadas para encontrar formas de solucionar o problema. E, assim, uma nova peça de conhecimento surge sobre o que pensávamos ser uma coisa boa e se revelando não ser tão boa afinal de contas.
A humanidade só realizará o mais elevado bem quando a ciência e a religião se integrarem
Antes de deixar esta parte da conversa, gostaria de inserir outra pequena observação. A emergência e o desenvolvimento da ciência inquestionavelmente ajudaram a aperfeiçoar o entendimento e o intelecto humanos, sobre isso não há argumento. Mas, ao mesmo tempo, se observarmos de perto veremos que também levaram a inteligência e o entendimento humano ao declínio. Como assim? Em tempos anteriores, quando a ciência estava começando a emergir e se desenvolver, as pessoas estavam muito impressionadas com seus alcances. As pessoas estavam excitadas pelas descobertas e pelos alcances tecnológicos da ciência. Colocaram todas suas esperanças em uma resposta aos seus problemas na ciência e na tecnologia. Todos os mistérios da natureza estavam sendo revelados e a ciência conduziria a humanidade para uma era de felicidade perfeita.
Essas pessoas que sinceramente acreditaram na ciência, mudaram e começaram a duvidar de suas religiões e das respostas que elas forneciam. Muitas pessoas perderam a fé e descartaram a religião.
Infelizmente, a verdade tratada pela ciência é somente uma verdade especializada ou uma fração da verdade. Ela lida apenas com o mundo físico. A ciência não tem respostas para questões que lidam com os problemas internos humanos, as respostas em busca das quais a humanidade previamente se voltava para a religião. O descarte da religião nos tempos modernos não teria sido uma grande perda se por religião quiséssemos dizer as formas institucionais conhecidas como religião, mas essa separação é também uma ruptura daquela parte da religião que lida com a solução dos problemas internos humanos.
Com a ciência não assumindo interesse nesses campos e as pessoas os descartando, surgem as grandes lacunas. As respostas que tinham sido anteriormente buscadas e providas pelas religiões foram ignoradas, causando um atraso no crescimento mental e espiritual da humanidade. Não somente um atraso, mas em alguns casos causou um movimento retrógrado.
A natureza do mundo, da vida e dos problemas humanos não permite que a humanidade ignore a necessidade da religião. Respostas fundamentais, imediatas e práticas são ainda tão requisitadas como antes. Quando a ciência for vista como sendo incapaz de fornecer uma resposta para essa necessidade e quando os seres humanos se cansarem pela fascinação pela ciência, estes caem em si e se lembram dessa necessidade fundamental em seu interior. Então, os seres humanos se voltarão mais uma vez para a religião em busca de suas respostas. Mas devido a interrupção do fluxo de desenvolvimento mental, ou de seu recuo, tal busca é muito instável. Poderia mesmo ser necessário começar tudo de novo. Exemplos disso podem ser vistos em alguns dos desenvolvimentos religiosos em países altamente desenvolvidos, onde, apesar de serem circundados por elevados avanços científicos, as pessoas tem caído estúpida e ingenuamente no charlatanismo (x).
(x) A referência é para a proliferação de cultos religiosos ‘instáveis’ em países industriais altamente desenvolvidos.
Seja como for, a ciência não é desprovida de méritos e bênçãos em levar a um entendimento melhor nos círculos religiosos. É bem sabido como a religião, especialmente em sua forma institucional, tomou um papel ativo em suprimir o desenvolvimento da inteligência humana. Algumas religiões cegamente se agarram a crenças e práticas absurdas, mesmo quando se confronta com seus próprios fundamentos.
O desenvolvimento da ciência, em particular suas atitudes e métodos, tem tido uma medida de boa influência sobre a religião e as atitudes religiosas na sociedade. No mínimo, tem dado a oportunidade, ou agido como catalisadora, para a religião reavaliar alguns dos seus ensinamentos e atitudes. Também serve como uma escala para avaliar as respostas dadas pelas diferentes religiões e oferecer a elas uma chance de melhorá-las.
Entretanto, do ponto de vista das massas, especialmente nos países que receberam influências científicas em suas perspectivas e métodos, a ciência não parece ter tido um efeito benéfico significativo sobre o estilo de vida e no bem-estar mental. A ciência por si só não é de muito interesse para muitas pessoas. Embora muitos possam olhar para a ciência favoravelmente, as crenças a seu respeito são muito parecidas com o modo como acreditam em algo mágico ou místico. Suas crenças são ingênuas, não estão baseadas no conhecimento. Isto é o ‘cientificismo’. Quando a maior parte das pessoas pensa sobre a ciência, elas a ignoram como um todo e focam diretamente na tecnologia, que é tomada como uma forma de gratificarem seus desejos. Por essa razão, o desenvolvimento da ciência tem tido pouca influência positiva no conhecimento, no entendimento ou nas atitudes da sociedade.
Por um lado mais positivo, neste ponto da história, as pessoas parecem ficar menos excitadas a respeito da ciência e estão começando a observar suas necessidades em relação à religião. Numerosas religiões estão tratando dessas necessidades em níveis diferentes. Ao mesmo tempo, alguns membros dos círculos científicos estão se tornando conscientes das limitações da ciência ortodoxa, expandindo os horizontes de sua pesquisa a fim de incluir as religiões, o que sugere a possibilidade de uma ciência completamente desenvolvida mesclando com uma religião completamente desenvolvida, podendo juntas levar a humanidade à realidade, à paz e a uma vida livre de obsessões insensatas.
Por outro lado, a ciência pode estar tentando provar alguma coisa que a religião já predisse. Embora a humanidade não possa esperar por uma resposta, devemos providenciar uma de algum tipo e essa resposta se tornou a religião. Essa resposta está ainda para ser provada, mas a aceitamos por agora, enquanto a ciência vagarosa e metodicamente a checa. Neste cenário, a ciência é aquele esforço da parte da humanidade para provar as verdades (ou não-verdades) da religião. Olhando para isso dessa maneira, os dois campos se harmonizam; tendo surgido de uma origem comum, elas eventualmente se fundem mais uma vez.
Enquanto o tempo passa, os limites do método científico uma vez mais serão alcançados. A ciência não estará apta para provar as verdades apresentadas pela religião. Um número de cientistas proeminentes está começando a perceber isso. Eles dizem que este final, a verdade última falada pela religião, está além do alcance da ciência em qualquer estágio no tempo.
Conversamos sobre ciência e também religião, indicando as origens e os desenvolvimentos de ambas. Neste momento, vamos nos voltar para o Buddhismo e, finalmente, chegar ao assunto destinado desta conversa.
…Muitas pessoas atualmente veem a ética meramente como mandamentos arbitrários de certos grupos de pessoas… mas enquanto a ciência tem se ausentado de qualquer consideração sobre ética ou valores, o Buddhismo estuda e ensina o papel da ética dentro do processo natural…
Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda
em acordo com Buddhadhamma Foundation
Para Distribuição Gratuita
© 2015 Edições Nalanda
Nota: “Escritos sobre o Buddha Dhamma” consiste de um conjunto de escritos de um dos mais respeitados monges da Thailândia contemporânea, Venerável Ajahn Payutto.
* Se você tem habilidades linguísticas e gostaria de traduzir e dispor suas traduções em nossa sala de estudos para que mais pessoas possam ter acesso aos ensinamentos do Dhamma, nós o/a convidamos para entrar em contato conosco. Precisamos de tradutores do espanhol, inglês, alemão e outras línguas.