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Durante seu longo ministério de quarenta e cinco anos, o Buddha caminhou largamente pelos distritos do norte da Índia. Mas durante o retiro das chuvas (vassa) ele geralmente ficava num lugar. Aqui segue-se um breve esboço de seus retiros coletadas de textos:
1º ano: Varanasi. Após a primeira proclamação do Dhamma na lua cheia de julho, o Buddha passou seu primeiro vassa em Isipatana, Varanasi.
2º, 3º e 4º anos: Rajagaha (no arvoredo do bambu, Veluvana). Foi durante o terceiro ano que Sudatta, um chefe de família de Savatthi conhecido por sua generosidade como Anathapindika, “o provedor dos desesperançados”, tendo ouvido que um Buddha havia surgido, buscou-o, ouviu-o e tendo adquirido confiança (saddha) no que Ensina, no Ensinamento e no Ensinado (o Buddha, Dhamma, Sangha), atingiu o primeiro estágio de santidade (sotapatti). Era renomado como o principal apoiador (dayaka) do Mestre. Anathapindika havia construído o famoso monastério Jetavana em Savatthi, conhecido como Sahet-mahet, e oferecido ao Buddha e a seus discípulos. As ruínas desse monastério ainda podem ser vistas.
5º ano: Vesali. O Buddha teve retiro no Saguão do Pináculo (kutagarasala). Foi nessa época que o Rei Suddhodana ficou doente. O Mestre o visitou e pregou o Dhamma, ao qual o rei, ao ouvi-lo, atingiu a perfeita santidade (arahatta), e após gozar da graça da libertação por sete dias, faleceu. A Ordem das Monjas também foi fundada nessa época.
6º ano: Monte Mankulla. Aqui o Buddha realizou a “Maravilha Dupla” (yamaka patihariya). Ele havia feito o mesmo pela primeira vez em Kapilavatthu para sobrepujar o orgulho dos Sakyas, seus parentes.
7º ano: Tavatimsa (o Paraíso dos Trinta e Três). Aqui o Buddha pregou o Abhidhamma ou a Alta Doutrina para as deidades (devas) lideradas por sua mãe Mahamaya, que havia falecido sete dias após o nascimento do príncipe Siddhattha, e renasceu como uma deva em Tavatimsa.
8º ano: Floresta de Bhesakala (próxima de Sumsumaragiri). Foi aqui que Nakulapita e sua esposa, um casal jovial, vieram ver o Buddha, contaram-lhe sobre sua vida matrimonial muito feliz e expressaram o desejo de poder continuar a viver juntos tanto aqui quanto depois. Esses dois foram colocados pelo Buddha como líderes daqueles que ganham confiança.
9º ano: Kosambi – no Monastério de Ghosita.
10º ano: Floresta de Parileyyakka. Foi neste décimo ano que, em Kosambi, uma disputa surgiu entre dois grupos de monges devido a uma ofensa trivial cometida por um deles. Como não podiam ser reconciliados, e como não prestavam atenção às exortações, o Buddha retirou-se para a floresta. Ao final do vassa, após terem resolvido a disputa, os monges foram a Savatthi e imploraram o perdão do Buddha.
11º ano: Vila de Ekanala (no país Magadha). Foi aqui que o Buddha encontrou o fazendeiro brâmane Kasibharadvaja que falou com o Buddha de modo pouco cortês. O Buddha, entretanto, respondeu suas questões com sua característica sobriedade. Bharadvaja tornou-se um seguidor ardente do Buddha. Foi nessa ocasião que um discurso extremamente interessante, o Kasibharadvaja Sutta (Suttanipata), foi pronunciado.
12º ano: Verañja. A introdução do Vinaya é atribuída ao décimo segundo ano. Foi também durante este retiro que o brâmane Verañja foi ver o Buddha, fez uma série de perguntas sobre práticas Buddhistas e, satisfeito com as respostas, tornou-se um seguidor do Abençoado. Ele convidou o Mestre e a Sangha para passar a estação chuvosa (vassa) em sua vila de Verañja. Naquela época havia fome. O Buddha e seus discípulos tiveram que ser alimentados com comida muito vil fornecida pelos comerciantes de cavalos. Como era costume do Buddha de reencontrar quem o havia convidado, foi ver o brâmane ao fim do vassa. Esse último admitiu que, embora houvesse convidado o Buddha e seus discípulos para passar o retiro em Verañja, ele havia falhado em seus deveres para com eles pois fora pressionado por tarefas domésticas. Contudo, no dia seguinte ofereceu comida e roupas ao Buddha e à Sangha.
13º ano: Rocha Caliya (próxima da cidade de Calika). Durante esse tempo o velho Meghiya era seu atendente pessoal. O velho, atraído por um belo arvoredo de mangueiras, pediu permissão ao Buddha para lá meditar. Embora o Buddha lhe pedisse para esperar até outro monge chegar, ele repetiu o pedido. O Buddha lhe deu permissão. O velho foi, mas para sua surpresa foi oprimido por pensamentos de prazeres sensoriais, má vontade e destruição, e voltou desapontado. Nisso, disse o Buddha: “Meghiya, para que a mente se liberte do imaturo, cinco coisas são necessárias: (1) um bom amigo; (2) comportamento virtuoso guiado pelos preceitos essenciais para o treinamento; (3) boa deliberação tendendo ao livramento das paixões, à calma, à cessação, iluminação e Nibbana; (4) o esforço para abandonar maus pensamentos; (5) adquirir a sabedoria que discerne a ascensão e a queda das coisas”. [1]
14º ano: monastério Jetavana, em Savatthi. Foi nessa época que o Venerável Rahula, que ainda era um noviço (samanera), recebeu alta ordenação (upasampada). De acordo com o Vinaya, a ordenação mais alta não é conferida antes dos vinte; o Ven. Rahula havia então alcançado essa idade.
15º ano: Kapilavatthu (o berço do príncipe Siddhattha). Foi nesse ano que ocorreu a morte do Rei Suppabuddha, o pai de Yasodhara.
16º ano: Cidade de Alavi: Durante esse ano, Alavaka, o demônio que devorava carne humana, foi amansado pelo Buddha, e tornou-se um seguidor. Para as questões de Alavaka e as respostas do Mestre leia o Alavaka Sutta, no Sutta-nipata.
17º ano: Rajagaha, no Monastério Veluvana. Nessa época uma cortesã muito famosa, Sirima, irmã do médico Jivaka, morreu. O Buddha acompanhou o funeral, e pediu ao rei que informasse ao povo para comprar o corpo morto – o corpo que havia atraído tantos quando viva. Ninguém se importou com ele mesmo sem pagar nada. Nessa ocasião, dirigindo-se à multidão, disse ao povo em verso: “Vede um corpo, ferido e maquiado, Muitos ossos sobre ossos empilhados, Já foi objeto do pensar de tantos, Impermanente e instável é agora.” Dhammapada, 147.
18º ano: Rocha Caliya. Durante esse tempo a jovem filha de um tecelão encontrou o Buddha e ouviu seu discurso sobre a plena atenção da morte (marananussati). Em outra ocasião ela respondeu corretamente todas as quatro questões colocadas a ela pelo Mestre, porque freqüentemente refletia sobre as palavras do Buddha. Suas respostas foram filosóficas, e as congregações que não haviam pensado sequer um pouco sobre a palavra do Buddha não conseguiram entender o significado de suas respostas. O Buddha, entretanto, a elogiou e dirigiu-se a ela em verso assim: “Cego, cego é este mundo, poucos são os que enxergam. Tal ave a fugir da rede, poucos alcançam a graça. Ela ouviu o Dhamma e alcançou o primeiro estágio da santidade (sotapatti). Mas infelizmente ela morreu uma morte lastimável. (Para um relato detalhado dessa interessante história, e para as questões e as respostas, ver o Comentário ao Dammapada, Vol. III, p. 170, ou Burlingame, Buddhist Legends, Part 3, p. 14.)
19º ano: Rocha Caliya.
20º ano: Rajagaha, no Monastério Veluvana.
Do 21º ao 43º ano: Savatthi. Dessas vinte e quatro vassas, dezoito foram passadas no Monastério Jetavana, o resto em Pubbarama. Anathapindika e Visakha foram os principais apoiadores.
44º ano: Beluva (uma pequena vila, provavelmente situada próxima de Vesali), onde o Buddha suprimiu, por força de vontade, uma grave doença.
No 45º ano de sua iluminação, o Buddha faleceu em Kusinara no mês de maio (vesakha) antes do início das chuvas.
Durante os primeiros vinte anos da vida do Buddha, os bhikkhus Nagasamala, Nagita, Upavana, Sunakkhatta, Sagata, Radha e Meghiya, e o noviço (samanera) Cunda atendiam-no, embora não regularmente. Contudo, após o vigésimo ano, o Buddha desejou ter um atendente regular. Nisso todos os grandes oitenta arahats, como Sariputta e Moggallana, exprimiram sua vontade de atender ao Mestre. Mas com isso não concordou. Talvez o Buddha pensou que esses arahats seriam de maior serviço à humanidade.
Então os mais velhos requisitaram Ananda Thera, que havia ficado calado o tempo todo, para implorar ao Mestre que o atendesse. A resposta de Ananda Thera é interessante. Ele disse: “Se o Mestre desejar me ter como seu atendente, ele falará”. Então o Buddha disse: “Ananda, não deixe que os outros persuadam você. Você de própria vontade poderá me atender”.
[1] Todo este discurso está em A. IV, 354; Ud. 34 – 37, e brevemente no Comentário ao Dhammapada I, 287. No verso do velho (66) no Theragata, diz-se que o venerável Meghiya era de uma família raja Sakyan. Os versos do Dhammapada (33,34) são os seguintes: Caprichosa e volúvel é a mente / Duro é guardá-la e controlá-la é duro, / Mas o homem que é sábio a endireita, / Tal retesa o armeiro as suas flechas. / Como o peixe que sai do reino aquático / Lançado à terra, a mente estremece; / Desta maneira os domínios de Mara / Devem portanto ser abandonados.