Gil Fronsdal
Gil Fronsdal

~ Gil Fronsdal ~ 

Melhor que viver cem anos
Desprovido de insight e inquieto,
É um dia vivido
Com insight e absorto em meditação.
– Dhammapada 111

Coloque-se numa postura confortável e alerta, no chão ou numa cadeira.

Gentilmente feche seus olhos e estabeleça um senso de presença no interior de seu corpo. É de muita ajuda começar um período de meditação com duas ou três respirações profundas para estabelecer uma conexão clara entre o corpo e a mente, e desvanecer alguma preocupação da mente. Então, dirija sua atenção para simples e conscientemente perceber as sensações físicas de inspirar e expirar sem tentar controlar ou manipular sua respiração.

À medida que você se familiarizar com sua respiração, ponha sua atenção na área de seu corpo onde a respiração é mais clara ou mais fácil de concentrar. Pode ser o movimento de subida e descida do abdômen, o movimento do tórax ou a sensação do ar passando através das narinas. Para ajudar a manter a conexão entre as sensações físicas de respiração e a consciência, as pessoas acham útil, por vezes, de modo gentil e silencioso, rotular as inalações e exalações como “subida” e “descida” e “dentro” e “fora”.

Porque a vigilância à respiração desenvolve a nossa capacidade de estarmos estabelecidos e conscientes do presente, damos alguma prioridade ao manter um foco atento na respiração durante a meditação sentada. Sempre que você se perder com preocupações sobre a tagarelice superficial da mente, delicadamente, sem julgamento, restabeleça a sua atenção na respiração.

Entretanto, quando alguma outra sensação ou experiência se torna tão forte que vocês achem difícil permanecer atentos à respiração, deixem a respiração e permitam que a sensação mais forte seja o centro da atenção. Vocês podem achar útil distinguir entre o primeiro plano e o pano de fundo da consciência. Inicialmente, coloquem sua respiração no primeiro plano da consciência, permitindo a todas as outras sensações e experiências permanecerem no fundo.

Mantenha quanto for possível a respiração em primeiro plano, sem forçar, deixando as experiências de fundo simplesmente acontecerem. Quando alguma experiência física, emocional ou mental deslocar a respiração no primeiro plano, tome isso como um novo lugar de pouso para a sua concentração.

Como um instrumento de ajuda para permanecer presente e concentrado numa experiência ou sensação que surgiu, você pode achar útil fazer uma nota mental, de maneira calma e gentil. Para sons: “ouvindo, ouvindo”; sensações de calor: “queimando, queimando”; satisfação: “alegria, alegria”; e assim por diante. O importante é perceber, sentir e permanecer completamente presente tanto quanto possível para qualquer que seja a experiência vivida. Mantenha uma percepção atenta em relação a ela por tanto tempo quanto permanecer presente, notando como as experiências mudam, caso mudem. Uma vez que uma experiência já foi vivenciada e já não é mais predominante, não requerendo sua atenção, retorne sua atenção à respiração.

Outra maneira de descrever a prática da vigilância é dizer que você, clara e conscientemente, coloca sua atenção na respiração até que algo realmente tire sua atenção dela. Quando isso ocorre, a conhecida “distração” torna-se o foco da meditação. Na verdade, a prática da vigilância não tem distrações, apenas alguma coisa nova para prestarmos atenção. Nada fica fora do escopo da meditação da vigilância. A gama completa de nossa humanidade tem a possibilidade de se desenrolar dentro da luz de nossa vigilância. Sensações físicas, sentimentos, emoções, pensamentos, estados mentais, humores e intenções estão todos incluídos.

Durante sua meditação, mantenha a atenção leve e relaxada, no entanto alerta e precisa. Se, por um lado, você pode distinguir entre as ideias, conceitos, imagens e estórias associadas com alguma experiência, e a imediata e direta sensação da experiência por outro lado, deixe a vigilância repousar com a experiência direta. Note as sensações físicas ou mentais que estão se manifestando tangivelmente no presente. Observe o que acontece quando você está atento a elas. Elas ficam mais fortes, mais fracas ou continuam as mesmas?

Observe também o seu relacionamento com a sua experiência. Você nota aversão, desejo, apreciação, julgamento, condenação, medo, apreensão, orgulho ou qualquer outra reação? A realização, por exemplo, de que uma sensação física dolorosa é diferente de sua reação a ela pode ajudá-lo a encontrar o equilíbrio em meio ao desconforto. Também é importante ser vigilante de quando a reação de vocês a uma experiência é mais vívida que a própria experiência. Quando isso ocorre, essa reação pode se tornar o ponto de descanso da atenção. Não tomem parte em seus pensamentos ou histórias, mas, simples e quietamente, estejam atentos sobre o que está de fato ocorrendo no corpo e na mente.

À medida que aprendemos a estar presentes atenta e calmamente em nossa meditação, uma profunda intimidade com nós mesmos e com o mundo surgirá. Ao cultivarmos a nossa capacidade de permanecer conscientes, sem interferir, julgar, evitar ou se apegar à nossa experiência direta, mananciais de discernimento e sabedoria têm a possibilidade de emergir.


Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda
revisão: Ricardo Sasaki
em acordo com o Autor

© 2014 Gil Fronsdal

Nota: “Tocar o Coração do Assunto” é uma compilação de ensaios editados sobre a prática buddhista da observação vigilante. Muitos destes capítulos começaram como palestras dadas aos grupos de meditação da noite de segunda-feira ou da manhã de domingo do Insight Meditation Center em Redwood City, Califórnia. Alguns dos capítulos foram escritos especificamente para a publicação em jornais, em revistas ou em boletins de notícias buddhistas. Este livro é uma oferenda do Dhamma.


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