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~ Bhante Vimalaramsi
Quando estiver praticando a meditação de amorosidade, comece primeiro enviando pensamentos amorosos e bondosos para você mesmo. Comece por relembrar um tempo em que estava feliz. O sentimento de felicidade surgirá como uma ardente ternura no centro de seu peito. Neste momento, quando esse sentimento surgir, faça um desejo sincero por sua própria felicidade – “Possa eu estar feliz… Possa eu estar cheio de alegria… Possa eu estar em paz e calmo… Possa eu estar alegre e benevolente… e assim por diante. Faça qualquer desejo benéfico e sincero que faça sentido para você. Se seu desejo não for sincero, ele se transformará num mantra, repetido de cor e sem sentido realista. É importante que o desejo formulado para você mesmo, e mais tarde para seu amigo espiritual tenha sentido verdadeiro para você e capture sua total atenção. Não repita continuadamente “Possa eu ser feliz”… Faça o pedido quando seu sentimento de amorosidade começar perder a força.
Quando você sentar em meditação, não mova seu corpo. Sente-se com suas costas retas, mas não rígidas. Tente manter as vértebras sobrepostas de modo confortável, uma em cima da outra. Esta posição levanta seu peito um pouco e facilita a irradiação do sentimento de amorosidade. Sente-se com suas pernas em posição confortável. Se você as cruzar com muita força, a circulação nelas pode parar causando dormência. Você pode usar uma almofada ou uma cadeira, mas não apoie as costas. Apoiar as costas para o fluxo de energia que sobe pelas costas e pode fazer você sonolento. Sente-se de forma confortável.
Após achar uma posição ereta e confortável, não a mude ; não mexa seus dedos; não se coce; não se esfregue; não se balance. Se você puder, sente-se tão imóvel quanto a imagem do Buddha na sua frente. Mover-se é uma distração e atrapalha o progresso da prática. Na hora em que você estiver sentado, irradiando o caloroso e ardente sentimento de amorosidade no centro de seu peito e fazendo um sincero pedido, sua mente irá vagar e começará a pensar em outras coisas. Isso é normal. Pensamentos nunca são seus inimigos. Não lute contra eles ou tente afastá-los. Quando uma sucessão de pensamentos chega e o enleva, perceba que você não está tendo a experiência da amorosidade ou formulando votos para a sua própria felicidade. Deixe partir o pensamento que surgir, mesmo em meio à sentença. Isso pode ser feito não continuando a pensar o pensamento, não importa quão importante ele pareça ser no momento.
Uma etapa muito importante neste ponto é perceber a rigidez ou tensão em sua cabeça e mente. Então as solte. Sinta a tensão se reduzindo. A mente expande e repousa. Torna-se muito tranquila. Não existem pensamentos e a mente fica excepcionalmente clara e alerta. Neste instante, traga-a de volta ao objeto da meditação, a amorosidade, e faça um pedido para a sua própria felicidade.
Não importa quantas vezes sua mente divaga e pensa sobre outras coisas. O que realmente importa é que você veja quando sua mente ficou distraída por um pensamento. O mesmo vale para qualquer sensação ou emoção que atraia sua atenção. Repare no movimento da mente ou na distração em outro lugar distante da amorosidade e deixe isto passar. Relaxe a sensação de rigidez ou tensão em sua cabeça ou em sua mente e suavemente dirija de novo sua atenção tranquila de volta ao objeto de meditação.
Este ponto é muito importante. Toda vez que você deixar passar uma distração, faça um pedido para sua própria felicidade, relaxar a tensão causada pelo movimento da mente, e de novo dirija sua atenção tranquila de volta à sensação de estar feliz, você estará fortalecendo sua vigilância. Não critique a si mesmo por acreditar que poderia fazer melhor ou que seus pensamentos, sensações, sentimentos e emoções são inimigos a serem esmagados e destruídos. Em definitivo, pensamentos e sentimentos severos contêm aversão, o oposto da prática de amorosa-aceitação (outra maneira de dizer amorosidade). Portanto, seja bom para com você mesmo. Faça da prática uma brincadeira. Divirta-se até com as suas distrações.
A importância de se relaxar a rigidez ou tensão após cada pensamento, sensação ou emoção não pode nunca ser repetida o bastante. Quando você deixar passar o aperto ou tensão você estará deixando passar o desejo. A compreensão disso é muito importante porque o desejo é a causa de todo sofrimento. Rigidez ou tensão sempre nos mostram onde nosso desejo e nossa falsa ideia de eu estão situados. Deixar passar essas tensões purifica sua mente e você se torna mais feliz.
Quando você estiver sentado imóvel, algumas sensações podem surgir e seu corpo – uma coceira, calor, tensão, dor ou um impulso de tossir ou espirrar. Não mexa seu corpo quando essas sensações surgirem. Sua mente automaticamente irá até a sensação ansiando para que ela vá embora. Esse tipo de ansiedade ocasiona que a sensação se intensifique até ela se tornar uma emergência na sua própria mente. Você não será capaz de aguentar e terá que se mexer. Mas as instruções são “Não mova se corpo por nenhuma razão”. Então, o que fazer? Observe que sua mente se dirigiu até a coceira, a tosse ou qualquer outra sensação e aos pensamentos a respeito daquela sensação. Neste momento abra mão dos pensamentos. Simplesmente deixe que eles lá fiquem. Em seguida, perceba a tensão na sua cabeça. Toda vez que uma sensação ou emoção surgirem, é natural para a mente fazer um punho apertado em volta delas. Este punho apertado é aversão. Abra o punho e deixe que a coceira ou sentimento fiquem onde estão. A verdade, ou Dhamma, do momento presente é que quando a coceira ou outra sensação qualquer surgem, elas estão lá! O que você faz com este Dhamma vai ditar se você sofrerá ou não sem necessidade. Resistir à coceira e tentar removê-la do pensamento vai gerar como resultado sofrimento tanto sutil como grosseiro.
Cinco agregados constituem o processo mente-corpo . Eles são corpo físico, sensação, percepção, pensamento e consciência. Sensações, tanto físicas como emocionais, são uma coisa e pensamentos são outra. Se você tentar controlar suas sensações com seus pensamentos, sua resistência às sensações se intensificará. Um sofrimento insuportável (dukkha) surgirá e você terá que se mexer. Se você estiver sentado meditando, o mínimo movimento interrompe a continuidade da prática e você terá que começar de novo. De modo que deixar passar os pensamentos a cerca das sensações significa deixar passar a vontade de controlar as sensações com seus pensamentos. Também significa deixar passar o desejo, o que conduz de modo direto à cessação do sofrimento.
Em seguida, observe o punho mental fechado em torno da sensação e deixe passar sua aversão por ela. Permita à coceira ou à tosse, sensação ou emoção, que fiquem onde estão por si mesmos. Veja-os como se fossem bolhas flutuando no ar, flutuando livremente em qualquer direção que o vento os soprar, sem resistência. Você aprende como aceitar de todo coração seja o que for que apareça no momento presente. Observe a sutil tensão em sua cabeça, suavemente relaxe e gentilmente direcione de novo sua amorosa atenção de volta para irradiar afeição desde seu coração e fazendo um pedido para sua própria felicidade.
A verdadeira natureza desses tipos de sensações é que elas não vão embora de saída. Sua mente saltará para frente e para trás, do objeto de sua meditação à sensação. Toda vez que isso acontecer, trate da mesma maneira. Deixe passar quaisquer pensamentos, sensações, relaxe a tensão, deixe abrir o punho mental fechado em torno da sensação, deixe ela estar lá. Tudo bem que aquele pensamento, sensação, estejam lá. Aquela é a verdade do momento presente. Um acrônimo que funciona bem para ajudar a se lembrar é DROPSS – Desista de Resistir ou Pressionar – Suavize e Sorria. Deixe o que for que apareça ser aquilo que é sem tentar fazer disso outra coisa qualquer. Relaxe frequentemente a sutil tensão ou rigidez e gentilmente direcione novamente sua atenção de volta à sua meditação.
Após ter feito isso por cerca de dez minutos, comece a enviar pensamentos amorosos e bondosos ao seu amigo espiritual – alguém que, quando você pensa dele ou dela e de suas boas qualidades, você fica feliz – um amigo do peito do mesmo sexo, vivo, e não um membro da sua família. Mais tarde, após certo período, você será capaz de enviar amorosidade para membros de sua família.
Uma vez que você começar a enviar a amorosidade para seu amigo espiritual, permaneça nisto. Quaisquer votos amorosos que você fizer para sua própria felicidade, deseje-os também para seu amigo espiritual. Comece irradiando afeto e paz ao seu amigo. Visualize seu amigo sorrindo e feliz e ele ou ela lembrará você de estar sorrindo e feliz, também. Quando você estiver sentado e irradiando afeto, sorria com sua mente. Mesmo que seus olhos estejam fechados, sorria com seus olhos. Ponha um pequeno sorriso em seus lábios e em seu coração e seu rosto irá deixar se irem suas tensões e sua mente se tornará feliz.
Isso pode parecer um pouco falso, mas cientistas descobriram que os cantos da nossa boca são importantes; a posição dos lábios corresponde a diferentes estados mentais. Quando os cantos dos seus lábios estão virados para baixo, seus pensamentos podem se tornar pesados e prejudiciais. Quando virados para cima, seus pensamentos se tornam mais claros e aparece a alegria. Um sorriso pode ajudá-lo a mudar sua perspectiva a respeito de todos os tipos de sentimentos e pensamentos. Sorria o máximo que puder de tudo que surgir e de tudo aquilo a que você direcionar sua mente.
A visualização pode ser difícil – turva, nebulosa, distante, fugaz. Não se preocupe. Se puser demasiado esforço para melhorar suas imagens, vai arranjar uma dor de cabeça. Alguns não conseguem visualizar nada, então você pode trazer seu amigo até seu coração usando seu nome. Você quer utilizar cerca de 70% de seu tempo para o sentimento de amorosidade, 20% são usados para fazer votos sinceros que ajudem o sentimento para que a felicidade do seu amigo cresça. Apenas cerca de 10% do seu tempo precisará ser gasto visualizando seu amigo. O sentimento de amorosidade é de longe a parte mais importante da meditação. A visualização eventualmente melhora com um pequeno esforço.
Quanto mais sincero e entusiástico for seu interesse em mandar amorosidade para você próprio e para seu amigo espiritual, menos você sentirá sonolência ou tédio mental. Quando sonolência e tédio ocorrem seu corpo pode começar a desmoronar. Este é o único momento em que você pode mover seu corpo e ajeitar-se, mas não faça isto muitas vezes. Se você perceber sua mente se entediando, tome mais interesse por seu amigo; veja ele ou ela fazendo coisas que você sinceramente aprecia. Visualize as ocasiões em que ele ou ela foram de muita ajuda e generosos, ou fizeram você rir e estar feliz. Isto ajuda a aumentar seu interesse e energia, e acalmará o tédio.
Quando você começar esta meditação, sente-se por meia hora. Passe os primeiros dez minutos enviando amorosidade para si mesmo, e o resto do tempo para seu amigo espiritual. Lembre-se do amigo o tempo todo. Quando se sentir mais à vontade, pode sentar-se mais tempo, mas nunca por menos de trinta minutos.
Esta não é uma meditação passiva para ser praticada apenas quando sentado numa cadeira ou almofada. Pode ser praticada o tempo todo, especialmente durante as atividades diárias. Frequentemente nós andamos por aí numa névoa de pensamentos aleatórios, absurdos. Porque não testar esta meditação sempre que nos lembrarmos dela?
Observe o que sua mente anda fazendo no momento presente e deixe estes pensamentos distraídos passarem. Relaxe a rigidez e deseje felicidade a alguém. Não importa a quem – à pessoa andando ao lado de você, a si próprio ou a todos os seres. Enviá-los é mais importante do que a direção em que você os envia. Faça isso o máximo que for possível ao longo do dia. Quanto mais você se concentra em enviar e irradiar pensamentos amorosos e bondosos, mais você afeta de forma positiva o mundo a sua volta. Como resultado sua mente torna-se desperta e feliz ao mesmo tempo.
Outros benefícios da prática da meditação da amorosidade são: você dorme mais fácil e mais profundamente; você acorda mais fácil e mais rapidamente; as pessoas gostam de você; seu rosto fica brilhante e bonito; sua mente se torna clara rapidamente.
Praticar a meditação da amorosidade pode conduzir à experiência do Nibbāna se você seguir todos os Brahmavihāras: a prática da amorosidade, da compaixão, da alegria apreciativa e da equanimidade. Quando a meditação da amorosidade é praticada como parte das Brahmavihāras, ela pode conduzir o praticante até o quarto jhāna, um nível de meditação onde equanimidade e vigilância são as mais puras. A partir do quarto jhāna, o insight nas Quatro Nobres Verdades pode rapidamente se desenvolver, conduzindo à realização do caminho e dos frutos – Nibbāna.
Traduzido por Aluízio A. Sampaio
para o Centro de Estudos Buddhistas Nalanda
publicado originariamente no Bhavana Magazine – Edição Outono 2001
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