munindaji&godwinGodwin: Vou tocar em alguns aspectos de como nós podemos trabalhar com nossos pensamentos no contexto da meditação.

Uma coisa que podemos descobrir é que nossos pensamentos surgem mecanicamente. Eles simplesmente surgem. Pegue o que está acontecendo agora. Você está ouvindo a mim, mas você está absorto nos pensamentos que estão passando pela sua mente. Você não quer que esses pensamentos surjam, mas eles apenas surgem; e então nós fazemos algo muito interessante: alguns pensamentos nós permitimos apenas que surjam e desapareçam, enquanto outros, nós os seguramos, nós nos identificamos com eles. Eles podem nos sobrecarregar, eles podem nos controlar. Então, isso é uma das coisas que podemos descobrir com a conscientização, que quando pensamentos surgirem, sem segurá-los, se você puder somente permitir que eles vão embora, então, não há problema. Esse é um aspecto para aprendermos e explorar.

Outra é a conexão, a relação, entre pensamentos e nosso estado mental. Desta forma, como eu disse, quando seguramos nossos pensamentos, quando identificamos a nós mesmos com os pensamentos, então nosso estado mental se transforma. Por isso, eu tenho sugerido que aprendamos a não reagir quando os pensamentos surgem.

 

Emoções

Outra área interessante com a qual temos trabalhado é a conexão entre pensamentos e emoções. O que vem antes, os pensamentos ou as emoções?

(Todos responderam: “Pensamentos”)

Espero que vocês tenha realmente descoberto isso, aprendido sozinhos.

Então, em outras palavras, se você aprender a lidar com pensamentos, a trabalhar com pensamentos, você desenvolve o controle sobre a emoções. Outra coisa é quando você tem uma emoção são os pensamentos que a tornam maior. Então, eles podem realmente multiplicar a emoção que você está tendo.

 

Histórias

Outro aspecto interessante é a forma como criamos histórias dos nossos pensamentos e não percebemos que criamos as histórias, mas tornamo-nos vítimas das histórias que nós mesmos criamos. Às vezes, as histórias podem até se tornar filmes, filmes na nossa mente do que aconteceu no passado e sobre o que acontecerá no futuro. Às vezes, criamos filmes muito destrutivos, e nós somos o diretor, somos o produtor, somos o ator e somos a vítima, tudo nesse drama. Vou dar um exemplo do que é essa história e como a história pode se tornar uma espécie de realidade naquele momento.

Esta é uma história da literatura buddhista. Então, havia um jovem monge que queria desistir de usar seu manto. Ele não havia contado ao abade sobre seus planos, mas um dia o abade estava com dor de cabeça, então ele pediu a esse jovem monge que lhe fizesse uma massagem, e para isso esfregasse um pouco de óleo em sua cabeça. Então, enquanto massageava a cabeça, o jovem monge estava pensando: “Agora, talvez em um mês ou dois, eu desistirei das minhas vestes. E depois de eu desistir de minhas vestes, talvez eu encontre um emprego, e quando eu encontrar um emprego receberei algum dinheiro, e quando eu ganhar dinheiro suficiente, talvez encontre uma garota e me case com ela. Mas às vezes essas esposas podem ser pessoas impossíveis, e se minha esposa se tornar difícil ou impossível, eu vou bater nela. E ele, então, bateu na cabeça do velho monge!

Nós estamos rindo, mas isso é o que também fazemos com nossos pensamentos. Então, isso mostra que esses pensamentos podem ser tão convincentes e que eles podem nos criar fantasias, e aceitamos a fantasia como realidade. Então, existe uma conexão, um relacionamento, entre as estórias e as emoções. No Dhamma, há uma palavra pāli muito interessante para descrever esse processo que acontece em nossa mente: papañca. O que ela significa é construir, fabricar, criar, projetar, todas essas coisas que nós fazemos com nossos pensamentos, e é dito que existe uma relação direta entre conceitos e o sofrimento. É assim que nosso sofrimento é criado.

Portanto, este é o motivo pelo qual é muito importante aprender a trabalhar com nossos pensamentos, entender os pensamentos, compreender realmente a natureza e a construção de pensamentos. Como disse anteriormente, se pudermos aprender a ter uma mente expandida, permitindo que esses pensamentos e emoções venham e vão, permitindo que as sensações surjam e desapareçam, estamos naquele espaço sem reagir a nada, então, aquele é um momento de liberdade.

Na tradição tibetana, eles usam uma comparação muito interessante. Eles comparam a mente a um céu espaçoso e os pensamentos a nuvens. As nuvens não afetam o céu, o céu não afeta as nuvens. Então, isso mostra que é muito importante ter espaço, aquela mente espaçosa, permitindo que qualquer coisa surja e passe.

 

Propriedade

Outro aspecto do pensamento é que temos um condicionamento muito forte para nos identificarmos com eles e dizer: “Estes são meus pensamentos”. “Eu estou pensando”. Novamente, sem perceber isso, são os pensamentos que criaram o pensador. É por isso que tenho sugerido, em algumas ocasiões, para apenas vermos pensamentos como pensamentos, sem um dono, sem a ideia de que estes são meus pensamentos, mas apenas pensamentos que surgem e desaparecem.

Assim, é engraçado como temos essa ideia de posse. Começamos possuindo tudo: pensamentos, emoções, sensações, pessoas, bens. E quando começamos possuindo as coisas, não gostamos de nos afastar das coisas que possuímos. É por isso que achamos difícil deixar as emoções passarem, pois pensamos: “Esta é minha raiva, meu medo, minha ansiedade, minha tristeza”; assim, o que quer que consideremos meu, não queremos deixar passar. Esse é o aspecto mais profundo do Dhamma: indicar para nós que, de fato, não há possuidor. Há apenas pensamentos, há apenas sensações, há apenas emoções.

É esse sentido de propriedade que está criando nosso sofrimento. Nada deve acontecer com minha mãe – qualquer coisa pode acontecer com as mãe de outras pessoas. Nada deve acontecer com meu corpo, mas com os corpos dos outros – não têm problema qualquer que seja. E, então, do mesmo jeito nós temos essa identificação com pertences: meu copo, ele deve permanecer comigo; mas outros copos, não têm problema. Nós até traçamos a mesma distinção sobre animais. Este é meu gato; este é o gato do vizinho. Então, o gato do vizinho não deve vir e atacar meu gato. Como pode o gato do vizinho fazer aquilo? Então, isso é uma questão interessante de se refletir: “O que acontece no momento da morte com todas as coisas que pensamos possuir?” Se realmente possuímos então devemos ser capaz de levá-las conosco até depois da morte, mas não podemos.

Esses são aspectos muito profundos dos ensinamentos do Buddha. Ver a conexão entre nosso senso de propriedade, com o senso de eu e mim, e como isso cria sofrimento. Então, essas são algumas áreas, alguns aspectos que podemos descobrir por nós mesmos na prática da meditação na vida diária.

No cotidiano, é muito importante utilizarmos a conscientização apenas para saber que pensamentos cruzam sua mente e como isso o está afetando, como tem relação com as emoções. Assim, se você realmente conseguir praticar isso, ficar constantemente atento a isso, então, vagarosamente pode haver uma mudança no que está acontecendo com você.

Costumamos dizer que temos certas preocupações, temos certos problemas. Mas o que acontece com essa preocupação, o que acontece com esse problema quando os nossos pensamentos estão ocupados com outra coisa? O problema pode não ter sido resolvido, mas, quando isso acontece, não é uma fonte de sofrimento. Se um amigo ou parente adoece, sempre que pensamos nessa pessoa, isso gera o sofrimento, gera a preocupação. Mas, quando os nossos pensamentos estão ocupados com alguma outra coisa, a pessoa continua doente, mas sua doença deixa de ser uma fonte de sofrimento para nós. Isso demonstra como o pensar e os pensamentos têm uma relação direta com o nosso sofrimento.

Assim, apresentei alguns aspectos, algumas áreas em que usamos os pensamentos de forma destrutiva. Ontem nós discutimos as imagens que surgem nos relacionamentos, e novamente as imagens são criadas pelos nossos conceitos e pelos nossos pensamentos.

 

O Uso Positivo dos Pensamentos

Mas os pensamentos também podem ter um uso positivo, uma pessoa pode usá-los criativamente. Como podemos usá-los criativamente? Usando o pensamento para refletir, analisar. Portanto, esse é um exercício muito importante. Uma meditação muito importante para que nos desenvolvamos, usando nossos pensamentos para refletir. Deveríamos constantemente refletir sobre nosso comportamento: “Como estou me comportando?” “O meu comportamento está criando sofrimento para mim, criando sofrimento para os outros?” É especialmente muito importante que vejamos por nós mesmos como estamos criando nosso próprio sofrimento. Então, percebemos que somente nós mesmos podemos provocar uma mudança; então, tomamos responsabilidade por nosso sofrimento e podemos mudar tal situação.

Isso nos traz às Quatro Nobres Verdades que o Buddha descobriu. A Primeira Nobre Verdade é o fato do sofrimento. Como o sofrimento é considerado uma Nobre Verdade? O que há de nobre no sofrimento? Qual é a sua resposta?

Participante do retiro: Porque se não entendemos o sofrimento não praticaremos.

Godwin: Você pode dizer isso. É nobre porque quando sofremos, como eu disse, podemos refletir sobre o que está causando o nosso sofrimento. Então, quando você sofre, não veja como algo negativo, veja como uma Nobre Verdade.

Mas o que é mais importante é a Segunda Nobre Verdade. Ela nos leva ao conhecimento do que está causando o sofrimento ou quem está causando o sofrimento. Agora, este é um ensinamento bem difícil para nossa compreensão: que nós estamos criando o sofrimento. É muito fácil para nós atribuir aos outros a responsabilidade pelo nosso sofrimento. Nós não estamos fazendo nada a respeito do nosso sofrimento. Os outros fazem algo com relação a ele. Desta forma, se você puder compreender, bem claramente, a Segunda Nobre Verdade, a Terceira e a Quarta, simplesmente se desenvolvem a partir dela.

 

Meditação como medicação

Às vezes eu defino meditação como o descobrir do medicamento para a doença que nós criamos. Então, durante os últimos dias, temos estado a descobrir o medicamento e estou muito feliz, ao olhar para seus rostos, que o medicamento parece estar ajudando, parece estar funcionando. Agora, o que é importante é continuar a tomar o medicamento na vida cotidiana. É o que vamos discutir amanhã, sendo o último dia inteiro. Amanhã gostaria que você examinasse o medicamento que temos tomado, as diferentes técnicas que temos praticado, que refletisse sobre as diferentes discussões que temos tido. Antes de sair, você deve estar muito claro sobre o medicamento que você precisa tomar.

Amanhã teremos uma discussão sobre como integrar a meditação com a vida diária. Então, reflitam sobre todos os problemas, e sobre todas as dificuldades que você pode encontrar, ou que você esteja encontrando na vida cotidiana e, então, discutiremos como alguém pode encontrar a solução a partir dos ensinamentos do Buddha.

Agora, há alguma dúvida sobre o que eu disse? Façam as perguntas, não se preocupem se é uma boa pergunta, uma pergunta ruim, uma pergunta tola ou uma pergunta profunda, apenas perguntem sobre o que lhes interessam.

 

Perguntas e Respostas

Participante do Retiro: Falando sobre meditação, gostaria de saber se nós meditantes deveríamos agir como pedras? Parece que todos os meditantes se comportam como pedras. Para mim, sinto que somos muitas pedras. Porque nesta manhã, quando eu fazia meditação em pé, fiquei ali parado junto à janela e vi a natureza: era tão bela, o vento se movendo e a natureza dançando, e eu pensei: ‘Podemos fazer meditação dançando? Estava tudo tão pacífico. Então é isso que desejo saber.

Godwin: Eu também estava me comportando como uma pedra?

Participante do retiro: Francamente, sim, mas felizmente às vezes você ri e ri de forma genuína, então, eu não acho você é como uma pedra na maioria das vezes.

Godwin: Tenho enfatizado a prática da amorosidade, e essa prática é completamente o oposto de ser como uma pedra. É realmente o desenvolvimento de uma amizade. Isto é o que sempre enfatizo quando digo: você consegue sentir que é seu melhor amigo? Você pode realmente sentir as outras pessoas ao seu redor? Temo que as pedras não consigam sentir nada. Você também descreveu a natureza – tenho enfatizado muito isso de estabelecer uma conexão com a natureza.

Estou feliz de dizer que há uma bela atmosfera aqui, de pessoas ajudando umas as outras, sendo amigáveis umas com as outras, especialmente as pessoas trabalhando na cozinha, então, eu não tenho a impressão que elas estão se comportando feito pedras. Acho que o que você está confundindo desapego com não ter sentimentos. Então, aqui a ênfase completa está no sentimento. Tenho dado ênfase à experiência de alegria, leveza, amizade; e penso que o professor de yoga tem dado ênfase à importância de sentir o corpo. Talvez ele irá dizer a você que alguns de vocês podem estar se relacionando com seu corpo como uma pedra e não apenas na aula de yoga, mas esta é uma questão diferente! Então, penso que você está confundindo a mente não-reativa, a mente sem sofrimento, com falta de sentimento. Queria mencionar isso no último dia.

Gostaria também de repetir que aqui há uma agradável atmosfera, um grupo de amigos espirituais interagindo uns com os outros. De fato, um dos meditantes me disse nesta manhã que quando ele chegou estava tendo dificuldades para vivenciar os sentimentos, mas quando as pessoas começaram a sorrir e se mostrarem amigáveis, pela primeira vez ele sentiu alguns sentimentos. Foi muito agradável ouvir isso.

Mais alguma coisa?

Participante do retiro: Mestre, o senhor não respondeu minha questão. Podemos fazer meditação dançando?

Godwin: Oh, “dançando”. Eu não tinha ouvido a questão direito. Durante a meditação livre e externa, você é livre para dançar do seu jeito: a única coisa é não forçar, deixar vir naturalmente de seu coração; de outro modo, a dança não é algo real. É apenas porque você quer dançar que você deve dançar. Quando há alegria, leveza, bondade amorosa, acredito que se você dança ou não, pouco importa; isso é o bonito sobre esse ponto.

Alguma coisa a mais?

Participante do retiro: O poder da mente pode ser tão forte e firme como uma pedra?

Godwin: Eu não gostaria de compará-lo com uma pedra. Eu diria que ao invés de vê-lo como uma pedra ele deveria ser visto como algo quente, ele deveria ser visto como algo gentil, macio, doce. Estas são as qualidades espirituais que vêm com a prática. Então, ele é completamente diferente de uma pedra que é algo sem sentimentos. Algo bonito sobre os seres humanos é que nós temos essa habilidade de sentir, e deveríamos permitir que esse sentimento aparecesse, mas então esse sentimento deveria ser trabalhado, ele tem que ser compreendido.

 

Imagens

Participante do retiro: Você disse mais cedo que não deveríamos criar uma imagem sobre nós mesmos. Mas quando praticamos a meditação da amorosidade nós criamos uma imagem de nós como pessoas cheias de amorosidade, então as duas coisas são contraditórias?

Godwin: Muito boa pergunta, muito boa pergunta. Então, de certa forma, nós precisamos ter imagens, até mesmo para ter expectativas. O que é importante para nós é perceber de que maneiras as estamos usando de forma destrutiva.

Então, se não temos essas qualidades em nós, se ao invés de amorosidade nós temos ódio, ódio contra nós mesmos, ódio contra os outros, então é muito importante fazer uma mudança dentro de nós, aprendendo como ser nosso melhor amigo, aprendendo como ser um amigo para os outros. Dessa maneira não é prejudicial ter uma imagem: eu quero ser uma pessoa que é amigável e tenta praticar. Ou você ainda pode praticar sem ter uma imagem, mas apenas desenvolvendo essas qualidades e permitindo que seu comportamento surja daí.

Dessa forma, uma pessoa pode realmente praticar em dois níveis: se você gosta de uma imagem, você pode utilizá-la; caso contrário, você pode simplesmente praticar sem uma imagem e permitir que seu comportamento surja de quaisquer qualidades espirituais que desenvolveu. O que importa é ver se aquela imagem corresponde à realidade. É com isso que temos de trabalhar. Às vezes, imagens criam problemas se são irrealistas. Quando você tem uma imagem de como as coisas deveriam ser e o que acontece na realidade é outra coisa, o resultado é o sofrimento. Assim, há aspectos diferentes a essa questão. Fico muito feliz que boas perguntas estão surgindo. Muito bom.

Participante do Retiro:  Se a pessoa atingir a iluminação, ela não vai ter mais pensamentos?

Godwin: Não vejo nada de errado com os pensamentos. É o que eu venho tentando enfatizar para vocês. O que quero deixar claro para vocês é que podemos usar os nossos pensamentos de uma forma destrutiva. É isto que vocês precisam perceber no dia a dia: quando usamos os pensamentos de um jeito destrutivo, estamos criando sofrimento. Eu também disse que é possível usar os pensamentos de maneira criativa. Os pensamentos podem ter um uso muito positivo. Eu diria que uma pessoa iluminada teria pensamentos, mas essa pessoa não usaria os pensamentos de forma destrutiva.

Há uma citação muito interessante do próprio Buddha em relação aos seus próprios pensamentos. Eu gostaria de contar os detalhes. Um dos discípulos disse ao Buddha: “Você tem muitos poderes, você tem muitos poderes miraculosos”. E o Buddha disse: “Meu maior milagre é saber que quando um pensamento surge que ele surgiu; quando um pensamento continua, eu sei que um pensamento continuou; quando um pensamento desaparece, eu sei que ele desapareceu.

Isso mostra que não é a ausência de pensamento que é importante. Eu gosto muito disso. Então, podemos tentar trabalhar o terceiro aspecto: quando um pensamento desaparece. Para que alguém tenha esse tipo de mente, haverá de ter uma mente muito calma, uma mente alerta, apenas saber quando um pensamento desaparece.

Então, é sobre os pensamentos de uma pessoa iluminada. Acho que não devemos nos preocupar muito com as pessoas iluminadas!

Participante do Retiro: Na verdade, minha questão surgiu porque quando eu observava um gafanhoto por algum tempo, ele estava tão imóvel, tão calmo, parece que é o gafanhoto quem está em meditação. E eu comecei a pensar: Qual é diferença da meditação dele e da minha meditação? Assim, surgiu essa questão sobre nossos pensamentos.

Godwin: Deste modo você pode pensar sobre o gafanhoto e você pode deixar a pessoa iluminada em paz. Eu penso que temos bastante problemas com a mente não clara. Algo mais?

 

Entendendo a Mente

Participante do Retiro: Hoje, durante a meditação, tentei colocar mais esforço na observação dos pensamentos e descobri que quando eu coloco mais esforço na observação há menos pensamentos acontecendo. É como você disse, quando você convida emoções elas não vem, quando você convida pensamentos eles também não vem. É muito interessante.

Godwin: É uma descoberta muito importante. Quando não queremos que pensamentos surjam, eles surgem. Quando queremos que os pensamento surjam, eles não surgem. Quando não queremos as emoções, elas surgem. E quando queremos emoções elas não surgem. Por que a mente age contra nós? Essa questão é muito importante para refletir a respeito. É essa a natureza da mente? Ou nós condicionamos a mente dessa forma?

Eu acho que o que isso mostra é que não podemos dizer à mente: ‘Tenha pensamentos, não tenha pensamentos’. Não funciona assim. É como dizer a uma criança: ‘Faça isto, não faça aquilo’. E a criança gosta de fazer o que você não quer que ela faça. Então é por isso que enfatizo tanto o ser amigável. Se você quer entender uma criança, você precisa ser muito amigável e ver o que a criança quer, então, da mesma forma, se queremos entender a nossa mente, não podemos dizer à mente para fazer isto e não fazer aquilo, mas antes, com simpatia, tentar entendê-la.

Então, quando há amizade, quando há gentileza, quando há abertura, a mente pode começar a cooperar conosco. Caso contrário, nós dizemos para a mente para se comportar de uma forma e ela vai para o outro lado e nos irritamos com isso. Então, torna-se uma batalha e se torna outra grande luta. A meditação para a maioria das pessoas é uma luta. Luta contra a mente. Muitas vezes digo aos meditantes, se você tiver batalhas suficientes na vida, por favor, não faça da meditação outra batalha! Então, com amizade, precisamos entender como nossa mente e nosso corpo funcionam, e então, através desse entendimento, desenvolver o domínio da mente é a próxima coisa. Quando falei sobre a amorosidade, mencionei que um dos benefícios é que, quando existe amorosidade, a mente fica calma naturalmente.

Algo mais?

Participante do Retiro:  Seu ensinamento sobre amorosidade é como nos ensinar a ser um bodhisatta. Eu gostaria de praticar isso também, mas a dificuldade é que eu não posso ser um bodhisatta. Por exemplo, eu passo por um mendigo na rua. Eu gostaria de dar a ele 10 dólares, mas logo depois penso que eu só lhe daria 5 dólares, porque eu preciso dos outros 5 dólares para comprar meu almoço. Minha pergunta é: “Como ser um bodhisatta?”

Godwin: Estou muito feliz por você agora ser 50% de um bodhisatta! Porque de 10 dólares você dá 5 dólares, então matematicamente você é 50% de um bodhisatta! Então, eu tenho certeza que muito em breve você conseguirá os outros 50%. Chegará o dia em que você dará ao mendigo os 10 dólares e vai esquecer do almoço!

Participante do Retiro:  E sobre minha marmita?

Participante do Retiro:  O Ven. Dhammika nos contou sobre um incidente quando vocês estavam caminhando juntos. Você avistou um mendigo e lhe deu tudo o que tinha no bolso, então ficou sem dinheiro e vocês dois tiveram que percorrer um longo caminho até onde precisavam ir. Isso é algo do qual devemos tirar uma lição. Você se lembra?

Godwin: Não.

Participante do Retiro:  Meus pensamentos são formados por palavras. Não sei se os pensamentos dos outros também são formados por palavras.

Godwin: É uma descoberta muito interessante que você fez, que pensamentos são realmente palavras. Palavras e imagens, e eles causam sentimentos. Vamos tomar um pouco de exemplos. Vamos pensar no café da manhã de amanhã. Deixe-nos fechar nossos olhos e ver o que acontece com nossa mente quando pensamos no café da manhã de amanhã. Então, vemos pão, vemos café, qualquer coisa que está realmente lá nós vemos. Na verdade, essas são imagens que chegam e, então, com elas alguns sentimentos virão dependendo do que gostamos e do que não gostamos. Então, na verdade nossos pensamentos chegam na forma de imagens, palavras e sentimentos. Parece tão simples. E, então, o que ocorre conosco é que com essas coisas, essas imagens, filmes, nós criamos nosso sofrimento.

O interessante é que, com técnicas como as de concentração na respiração, quando não há pensamentos, nenhuma dessas coisas está presente – imagens, palavras -, mas estamos apenas lidando com as sensações. Palavras e imagens são sempre do passado. Nunca podemos ver figuras e imagens que não experimentamos antes. Então, somente quando elas estão ausentes é que algo novo pode acontecer. Essa é a beleza de algumas técnicas de meditação que nos ajudam a não ter imagens presentes e assim por diante.

Assim, isso é o que eu os tenho encorajado a fazer, a descobrirem por si mesmos sobre seus pensamentos, descobrirem por si mesmos sobre suas emoções, descobrirem por si mesmos sobre como o sofrimento é criado. Somos tão afortunados por ter essa mente e esse corpo! Às vezes eu falo para os meditantes que podemos ser nosso próprio laboratório e podemos fazer experimentos, podemos fazer descobertas e aprender por meio delas.

Sem tomar qualquer coisa como certa toda nossa vida torna-se um aprendizado; e deveríamos desenvolver um gosto por isso, deveríamos desenvolver uma curiosidade por isso, deveríamos achar isso muito interessante, divertido, às vezes engraçado. Então, quando você deixar esse lugar você poderá continuar a descobrir, você poderá continuar a aprender, você poderá continuar a conhecer. Temos essa abertura que nos possibilita aprender com qualquer coisa, podemos aprender com qualquer um, não apenas daqueles assim chamados professores, mas a vida em si mesma se torna o professor, nossa mente e corpo se tornam nossos professores, e eu penso que isso é um jeito bonito de viver.

Ontem estávamos conversando sobre relacionamentos. Apenas observando os cachorros que vêm aqui revela relacionamentos muito interessantes. O que temos aprendido somente de observar os três cachorros que vêm aqui? Você já os observou? É muito interessante ver o relacionamento deles. Assim como humanos. Fascinante de observar.

Falando em cachorros, eu gostaria de compartilhar com vocês uma experiência que tive em um dos retiros que dei em um país estrangeiro. No último dia eu estava conversando com os meditantes e uma delas disse ao grupo que o que quer que seja que ela tivesse aprendido comigo naquele curso, ela já tinha aprendido com seu cachorro. Então, eu fiquei curioso sobre seu cachorro. Eu disse a ela que, por favor, contasse mais sobre seu cão, e ela disse: “Bem, você nos diz para viver no presente, e isso é o que meu cachorro faz; você nos diz para nos sentirmos gratos, e meu cachorro está sempre grato”. E ela continuou descrevendo o comportamento do cachorro e o que aconteceu no retiro. Então, eu a perguntei: “Não existe nenhuma diferença entre seu cachorro e eu?” Ela disse: “Sim, você fala bastante, mas meu cachorro não fala nada!” Eu gosto bastante dessa história.

Algo mais? Alguma questão?

 

Feridas e perdão

Participante do retiro: Você nos ensinou a prática da amorosidade e como deveríamos ser amigáveis conosco e com os outros e como deveríamos refletir sobre as feridas que temos e perdoar os outros. Mas como sabemos que estamos realmente sendo sinceros em perdoar a nós e aos outros?

Godwin: Muito boa pergunta. Darei um exemplo prático. Suponha que você tenha uma ferida em relação a algo que você fez a outrem: culpa. Antes de curar a ferida, qualquer pensamento que surgisse sobre sua atitude você sofria por causa da culpa. Assim, a ferida estará curada quando a lembrança surgir e não houver mais culpa. Da mesma forma, alguém foi muito hostil e desagradável para você e quando a lembrança sobre a ação da pessoa volta, você sente ódio, sente raiva, sente animosidade. A ferida está curada quando a lembrança sobre aquele pessoa surge sem ódio, sem animosidade.

Foi bom você ter falado das feridas. Amanhã é o último dia completo que vocês terão para curar das feridas e eu gostaria de aproveitar para sugerir que vocês tentem curá-las e deixem todas as feridas aqui quando voltarem para casa.

Participante do retiro: Sobre outras feridas… por exemplo, um amigo meu se sente ferido por mim, acha que eu o magoei, mas não é o caso, eu não fiz nada de errado. Como eu posso ajudá-lo a se livrar da ferida?

Godwin: Assim, outras pessoas têm mágoas em relação ao nosso comportamento. Podemos tentar curar suas mágoas tentando explicar; ou se você realmente criou a mágoa, peça desculpas a elas e tente ajudá-las a curar sua ferida. Você sempre pode tentar. Às vezes, achamos difícil, então elas também podem achar difícil se curar. Mas o que é importante é que você não sofra como resultado disso, pois o que você pode fazer sobre isso? Você fez o seu melhor, e a outra pessoa não quer curar essa ferida. Portanto, não vamos criar uma ferida em nossa própria mente em relação à ferida.

 

A Prática de Amanhã

Gostaria de dizer algo sobre o que faremos amanhã. Então, uma coisa que sugiro, tente revisar as diferentes coisas que tentamos fazer aqui nos últimos dias e se houver quaisquer dúvidas, quaisquer dificuldades, por favor traga-as para a discussão de amanhã ou para quando nos encontrarmos individualmente. E também, por favor, reflita sobre como você pode integrar a meditação em sua vida diária, e se houver quaisquer questões ou problemas em relação a isso você pode preparar as questões e apresentá-las durante a discussão. Então nossa prática de amanhã estará relacionada a tal tema.

E a última sugestão é que eu gostaria que vocês examinassem as diferentes técnicas que praticamos e, se vocês tiverem dúvidas ou dificuldades, vocês podem apresentá-las também. Portanto eu não vou lhes dizer o que fazer amanhã: vocês são livres para usar qualquer técnica que gostem de praticar e explorar por si mesmos amanhã. É muito importante aprenderem a ser seus próprios professores, aprendendo a ser uma luz para vocês mesmos, como o Buddha disse.

Façamos alguns cânticos.


Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda

em acordo com The Association of Spiritual Friends of Godwin
Para Distribuição Gratuita
© Ms. Jeanne Mynett
© 2011-2018 Edições Nalanda, da tradução


Nota: “O Caminho Gentil da Meditação” é a transcrição de palestras realizadas por um mestre laico de meditação muito famoso no Sri Lanka, Sr. Godwin Samararatne.


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