~ por Godwin Samararatne ~

Godwin em Hong Kong

Godwin: Gostaria de lhes dar as boas-vindas neste retiro de meditação de um dia e gostaria de lhes dar algumas sugestões sobre a prática de hoje.

 

Sentindo-se Feliz

A primeira sugestão que gostaria de dar é que cada um de vocês deveria se sentir feliz pelo fato de poder vir aqui. Hoje é feriado e depois de trabalhar muito deveriam se sentir verdadeiramente felizes por terem decidido vir até aqui. Normalmente sentimo-nos tristes conosco, mas é muito importante sentirmo-nos bem conosco. Então, gostaria de realçar este ponto, sintam-se bem com vocês mesmos por poderem vir até aqui para meditar.

A sugestão seguinte é sentirem-se gratos pelo fato de poderem vir. Conheço alguns que gostariam de ter vindo, mas que, por diversos motivos, não o puderam fazer. Devem se sentir gratos por poderem vir e por estarem aqui.

 

A Qualidade de Apenas Saber

Um aspecto muito importante da meditação é a prática da consciência, vigilância, apenas tomar conhecimento do que está acontecendo. Então, neste dia único de meditação, tentaremos desenvolver esta qualidade tão importante, de apenas saber o que está acontecendo na nossa mente e corpo, momento a momento, o máximo que pudermos. E ainda que seja uma experiência desagradável, mesmo que seja algo que você considere estranho, apenas tome conhecimento do que está acontecendo, ao invés de ficar preocupado, pensando: ‘Estou fazendo isso certo? É normal experienciar essas coisas?’ Não é necessário ter esses tipos de pensamentos, mas apenas saiba que ‘isto é o que eu estou sentindo, esta é a sensação que estou experenciando’.

Outro aspecto importante relacionado com isso é estar atento, estar consciente com bondade amorosa, apenas tomar conhecimento do que está acontecendo de forma amigável. Pode ser como uma mãe que está apenas observando, olhando seu único filho de forma amigável. Vamos apenas aprender a observar, olhar, descobrir, tomar conhecimento do que está acontecendo na sua mente e corpo como uma mãe olhando seu único filho, de forma amigável, com gentileza e abertura.

 

Devagar, Silencioso e Sozinho

Com relação à atenção vigilante eis outra sugestão que eu gostaria de oferecer: aprenda a diminuir o ritmo hoje. Sei que em Hong Kong vocês têm que correr porque a velocidade da vida aqui é alta. Hoje acentuaremos aprender a relaxar e a só fazer coisas bem lentamente. Lentamente e também de um modo muito relaxado.

Outra sugestão que eu gostaria de oferecer é a prática do silêncio. Sei que é muito difícil para algumas pessoas ficar em silêncio porque falar é um hábito muito forte que temos. Então, hoje vamos fazer um esforço para estarmos silenciosos conosco e vocês verão uma conexão entre consciência, atenção vigilante e silêncio. Quanto mais consciente você é, mais silencioso você fica, e quando você está silencioso, a atenção vigilante surge naturalmente. Você gostará do espaço que o silêncio cria na sua mente.

Outro aspecto do silêncio é aprendermos a sermos sós com nós mesmos. Então, hoje, por favor, tentem ficar em silêncio e apenas estar sozinhos com vocês mesmos. Nós nos tornamos muito dependentes de coisas externas. Hoje vamos tentar apenas ser amigáveis conosco e ver se podemos estar em nossa própria companhia e desfrutar de nossa própria companhia. Aprendermos a ser nosso melhor amigo. É muito importante fazermos esta conexão com nós mesmos, quando nos vemos como o amigo mais precioso que temos.

Hoje haverá alguns debates em grupo e poderemos discutir os problemas ou dificuldades vivenciadas. Mas, ainda é muito importante, na meditação, ser autoconfiante, ter nossas próprias ferramentas. O Buddha enfatizou que o esforço próprio é o melhor esforço e que devermos ser autoconfiantes.

 

Desenvolvam a autoconfiança.

Outra sugestão muito importante que gostaria de oferecer é que hoje iremos tentar desenvolver a autoconfiança.  Ter a autoconfiança que lhes permitam lidar com o que quer que surja em sua mente e corpo. Na meditação é muito importante possuir essa autoconfiança, apenas saber o que está acontecendo na mente e no corpo, e então, aprender com eles, abrindo-se a eles.

Por isso, hoje vamos tentar ser como crianças, tentando aprender, fazendo descobertas sobre o que está acontecendo em nossa mente e corpo. É muito importante ter essa qualidade infantil para aprender, descobrir, ser curioso sobre o que está acontecendo em nosso corpo e mente, que é algo que podemos admitir como certo.

Tentem ver a meditação como uma viagem de autodescoberta, e se pudermos ter essa abertura, então poderemos aprender com qualquer experiência que tivermos hoje. Como eu disse, pode ser agradável, pode ser desagradável, mas aprendam a fazer as perguntas: o que posso aprender com isso? O que se mostra para mim? Esse tipo de atitude na meditação é muito importante.

 

Nada Especial

Uma última sugestão é: por favor, não tenham grandes expectativas de que irão atingir algo muito especial. Meditação não é nada especial. É somente o estar aberto às coisas comuns. Não é nada extraordinário. Não são os resultados que atingimos, mas a prática em si é o resultado; conhecer o que está acontecendo é o resultado, não o que vem depois. Por favor, lembrem-se disso. Talvez, nesta cultura, haja muita ênfase em ser orientado para um objetivo, para atingir resultados. Mas, na meditação, o resultado é a prática. É isso o que é realmente interessante em relação à meditação. O resultado é simplesmente estar aberto, sabendo o que está ocorrendo momento a momento, experienciando cada momento.

Estas são algumas sugestões bem práticas que eu queria oferecer a vocês hoje. Então, como podem ver no programa, haverá yoga, meditação andando, meditação em pé, haverá um grupo de discussão e cânticos – haverá muitas atividades hoje. Então vamos ver tudo isso como parte da prática. Mesmo enquanto estiverem almoçando, vamos aprender a fazer disso parte da prática. Eu darei inclusive instruções sobre como almoçar com uma mente meditativa.

 

Meditação Sentada Guiada

Vamos, agora, começar nossa meditação sentada. Aqueles que quiserem se levantar e mover o corpo antes, podem fazê-lo.

Agora, por favor, sentem-se numa posição confortável.

Fechem seus olhos e gastem algum tempo apenas aprendendo a relaxar, apenas relaxem seu corpo.

Apenas se sintam confortáveis consigo mesmos.

Gastem algum tempo sentindo-se felizes por estarem meditando agora. Sentindo-se bem pelo que vocês estão tentando aprender.

Agora, o que vocês vão fazer na meditação é algo muito, muito simples. Então, até que vocês ouçam o sino, apenas percebam, de instante em instante, o que vocês estão ouvindo, os pensamentos que estão tendo, as sensações que estão experimentando no corpo.

É algo muito simples, que todos podem fazer. O importante é estar alerta, estar desperto, estar presente, estar vivo, momento a momento.

Se alguém se tornar sonolento e tonto de sono, abra os olhos.

Nós ouvimos sons, temos pensamentos, experimentamos sensações, podemos ter emoções; apenas tomem conhecimento, momento a momento, de todas essas coisas que estão acontecendo. Fazendo amizade com elas, aprendendo a dizer ‘tudo bem’ a elas.

Se estiverem percebendo quaisquer sensações desagradáveis no corpo, apenas estejam abertos a elas, façam amizade com elas, estejam cientes delas. É como aprender a dizer ‘tudo bem’ aos ruídos que estão ouvindo.

Vocês têm conhecimento de cada pensamento que surge e desaparece em suas mentes?

[Sino]

Por favor, abram seus olhos, e quando mudarem de postura, apenas saibam o que estão fazendo e sintam as diferentes sensações no corpo. Assim, por favor, continuem a saber o que está acontecendo na mente e no corpo, momento a momento.

Podemos meditar em quatro posturas: sentada, em pé, andando ou deitado. Hoje iremos praticar em três destas posturas: sentada, em pé e andando.

 

Discussão sobre a Meditação Sentada

O que eu gostaria de discutir com vocês é o que realmente ocorre quando meditamos. Partilhem suas experiências e questionem sobre suas experiências enquanto meditam.

Assim, posso perguntar: há algum problema, alguma questão sobre meditação sentada? Eu disse para se sentarem e que estivessem atentos ao que está a acontecer na sua mente e corpo. Alguma questão? Alguma dificuldade?

Participante do retiro: Enquanto medito eu tenho muitos pensamentos e alguns são tão óbvios que nem sequer necessitamos observá-los, mas alguns são delicados, menores. É necessário observar esses pensamentos?

Godwin: Devemos tentar observar todos os pensamentos. Quando dei instruções para a meditação, eu disse: Podem estar conscientes de cada pensamento que surge em suas mentes? E é muito importante aprender a observar pensamentos sem os julgar: isto é delicado, isto não é delicado, isto é bom, isto é mau. Sem julgar, sem dar marcações positivas ou negativas, podemos apenas observar os pensamentos quando eles surgem e quando eles desaparecem?

Participante do retiro: Tenho meditado por mais de um ano e tenho muitos problemas, como a movimentação do meu corpo, dor no tornozelo e, depois de meditar por um período, tenho dificuldades quando tento me levantar, mas depois de caminhar um pouco fica tudo bem. Agora, meu ombro esquerdo dói. Assim, estou tendo todos esses problemas. Quero saber se estou meditando corretamente.

Godwin: Não os vejo como problemas. Tentei deixar muito claro que meditação é apenas saber o que quer que aconteça em sua mente e em seu corpo sem se preocupar: Estou fazendo certo? Estou fazendo errado? É muito estranho que isso aconteça? Repeti muitas vezes: apenas é para saber o que está acontecendo, e você pode dizer ok para o que estiver acontecendo, especialmente se for desagradável.

De qualquer forma, eu gostaria de repetir que é extremamente importante aprender a trabalhar com sensações desagradáveis em quaisquer formas que surjam no corpo. Só por conhecê-las e aprender a fazer amizade com elas, e não vê-las como problemas: isto é a prática, porque se enquanto medita você aprender a lidar com essas sensações desagradáveis que surgem, então, no dia a dia, quando eles surgirem, você saberá como lidar com elas. Então, é muito útil que essas sensações desagradáveis surjam enquanto você estiver meditando.

Participante do retiro: Eu estava pensando sobre a ansiedade. Tive ansiedade por algum tempo, mas quando eu tento chamá-la e olhar para ela, ela não vem – ou não de uma forma tão forte como eu costumava sofrer. Essa é a primeira coisa.

Outra coisa é que, se alguém teve ansiedade sobre um problema e não pode recordar a ansiedade mais tarde, então, quando o problema aparecer novamente, não há tempo para praticar, para ter experiência suficiente para enfrentar o problema, para examinar a ansiedade, para se livrar dela e para enfrentar o problema de frente.

Godwin: Então, minha resposta ao primeiro ponto: Pode haver um problema quando você desejou que a ansiedade viesse e ela não veio? Qual é o problema? Não é interessante? Quando temos ansiedade é um problema, e mesmo quando não temos ansiedade, isso também é um problema!

Participante do retiro: A minha pergunta é quando temos algum problema, ansiedade, por exemplo, e isso ocorre de tempos em tempos, queremos adquirir experiência em como lidar com isso. E quando você quer experimentar para praticar, ela não ocorre da mesma forma que ocorreu anteriormente, então não há nenhuma experiência para ajudar a solucionar a difícil questão.

Godwin: Eu acho que você estava presente no mosteiro quando apresentei os instrumentos para trabalhar com as emoções. Então, gostaria que você voltasse para casa, e como observei que você estava fazendo anotações, por favor, repasse as anotações e descubra por você mesmo, experimente usar as instruções e veja como você pode trabalhar com a ansiedade.

De qualquer forma, apenas um breve comentário sobre como trabalhar com essas emoções quando elas aparecem, porque eu sei que alguns de vocês não estavam presentes quando apresentei essas ferramentas sobre como trabalhar com as emoções.

Portanto, uma coisa que aprendemos hoje é, seja ansiedade, seja medo, seja raiva, seja dor física, apenas aprender a saber que essas coisas existem. E, como sugeri em relação à dor física, aprenda a aceitar essa ansiedade ou medo. Aprender a nos sentir receptivos a estas emoções desagradáveis ​​pode nos ajudar a trabalhar com elas. Portanto, essa é uma das ferramentas que eu apresentei, e aqueles de vocês que estiverem interessados ​​nas outras ferramentas que apresentei, talvez seja possível obter uma cópia da palestra que dei sobre as emoções e como trabalhar com elas.

 

Meditação Guiada com a Respiração

Durante esta meditação favor não sair da sala.

Eu gostaria que vocês continuassem conscientizando-se dos seus corpos. Vocês podem fechar os olhos e apenas sentir as diferentes sensações, os diferentes movimentos no seu corpo.

Aprendam a sentir o corpo, aprendam a amigavelmente sentir o corpo.

Sintam-se gratos que vocês têm este corpo e que podem usá-lo para a nossa prática.

Agora apenas sintam o que é sentar nesta postura. Vocês se sentem relaxados nesta postura?

Se conseguirem relaxar seu corpo, conseguirão relaxar a mente. O ato de relaxar é não resistir a nada em relação ao corpo e à mente.

Vamos agora passar algum tempo com a nossa respiração. Então, por favor, permitam que seu corpo respire naturalmente. Deixem o corpo respirar da forma como preferirem.

Quando o corpo está expirando vocês sabem que o corpo está expirando. Quando o corpo está inspirando vocês sabem que o corpo está inspirando. Foquem sua atenção total e completa à inspiração e à expiração.

É natural que surjam pensamentos. Somente estejam conscientes de que vocês estão tendo pensamentos. Não resistam a eles, não desgostem deles, mas prestem mais e mais atenção à inspiração e à expiração.

Se vocês estão tendo sensações desagradáveis ​​no corpo, por favor, aprendam a estar atentos a elas, estejam cientes delas, aprendam a fazer amizade com elas, aprendam a dizer que não há problema em ter sensações desagradáveis.

[Sino] – [Canto]

 

Discussão sobre Meditação com a Respiração

Participante do retiro: Durante a meditação fiquei com as minhas costas muito transpiradas. Fiquei todo molhado. A segunda questão é, quando foco na respiração ela se torna muito rápida. Quando tento focar noutra coisa então a minha respiração volta ao normal.

Godwin: Sobre a primeira questão sobre a transpiração nas costas, apenas saiba que há transpiração nas costas e deixe estar assim. Torne-se amigo dessa transpiração.

Sobre a segunda questão, de quando você foca na respiração a respiração tornar-se rápida e quando você foca em alguma outra coisa a respiração tornar-se normal: eu sugeriria que no início permita o corpo respirar normalmente, esqueça-se de focar na respiração, apenas sente e deixe o corpo respirar do jeito que ele gosta. Assim, por favor, dedique algum tempo apenas aprendendo o que é chamado não-fazer, permitindo ao corpo fazer o que ele gosta em relação à respiração. Não veja isso como meditação, mas apenas como um exercício que você está tentando desenvolver, apenas não-fazer, permitindo o corpo respirar da forma como ele gosta.

Há um mestre de meditação no Sri Lanka que diz que quando sentamos, se pensamos na meditação como algo especial, então, teremos problemas especiais! Pois aqui, estamos tentando dar atenção especial à respiração e então a respiração se comporta de um modo incomum, e quando se ignora a respiração, ela se torna normal. Assim, não vejam a meditação e a respiração como algo especial, e apenas estejam com ela. E mesmo quando vocês estão fora da meditação, quando pensarem que não estão meditando, apenas continuem a ter uma conexão com a respiração, continuem a estar cônscios da respiração em outros momentos também.

Deixem-me agradecê-los por perguntar questões tão úteis e práticas, e também agradecer àqueles que compartilharam experiências positivas conosco. É muito bom que possamos sentar aqui como um grupo de amigos espirituais, partilhando a experiência de cada um. Trata-se de algo muito valioso.

 

Participante do retiro: Quero saber se há algo que deva ou que não deva ser feito quando meditamos. Por exemplo, quando estou fazendo a meditação sentada eu não consigo parar de pensar. Parece que quando estou fazendo a meditação andando a situação é melhor, mas quando estou sentado, quando o pensamento vem, tenho um conflito se devo interrompê-lo ou apenas permitir que ocorra.

Godwin: Estou feliz que você tenha levantado essa questão, porque é um problema muito comum. Não é possível parar de pensar. Quanto mais tentamos parar de pensar, mais temos pensamentos. É por isso que quando dei a meditação guiada eu disse: é natural que os pensamentos surjam. Assim como na primeira meditação que fizemos, o que estamos tentando fazer é ter consciência, sermos conscientes dos próprios pensamentos. Pensamentos, sons, sensações, seja o que for que exista na mente e no corpo. Então, nesse tipo de meditação, se você tem pensamentos, não há necessidade de ter um conflito.

Também na segunda meditação que fizemos, na qual tentávamos estar conscientes de nossa respiração quando pensamentos surgissem, deveríamos estar conscientes, com plena atenção de que pensamentos estão surgindo e fazermos amizade com eles, não termos um conflito, e, então, voltarmos para a respiração. Mas podemos estar conscientes da respiração por alguns minutos e, então, outra vez, pensamentos irão surgir. Esta é a natureza da mente, da qual não temos muito controle. Assim, meditação é entender como nossa mente funciona, fazer amizade com ela e com seja o que for que estiver acontecendo, e treinar a nós mesmos para, lentamente, gentilmente, voltarmos para a respiração.


Palestras em Hong Kong – Retiro de 1 dia em Hong Kong – 12 de Outubro de 1997

Traduzido pelo Grupo de Tradução do Centro Nalanda
em acordo com The Association of Spiritual Friends of Godwin
Para Distribuição Gratuita
© Ms. Jeanne Mynett
© 2011 Edições Nalanda, da tradução


Nota: “O Caminho Gentil da Meditação” é a transcrição de palestras realizadas por um mestre laico de meditação muito famoso no Sri Lanka, Sr. Godwin Samararatne.


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